sexta-feira, 26 de novembro de 2010

26 de Novembro de 1930

26 de novembro. Faz oitenta anos que foi publicado o Decreto que sacramentou a "tomada da Comarca" (na visão mimosense), ou o "roubo da Comarca" (na visão sãopedrense).

Na verdade, esse Decreto sacramentou não apenas a mudança da Comarca. Ele sacramentou o fim do antigo Município de São Pedro de Itabapoana, e a "fundação oficial" do atual Município de Mimoso do Sul, à época elevado a essa condição sob o nome de "João Pessoa".

Pois havia Comarcas que abarcavam mais de um Município. Não necessariamente a mudança da sede da Comarca implicaria em perda da autonomia municipal. A própria Comarca do Itabapoana, por exemplo, até 1929, englobava dois Municípios: São Pedro e Ponte de Itabapoana.

O 02 de novembro, data da execução da "tomada" ou "roubo" da Comarca, ainda deixava margem para que subsistissem dois Municípios. Mas o 26 de novembro foi o "golpe mortal" - foi a ratificação estadual das decisões locais. E, como estávamos no início do Governo Provisório e de suas Interventorias estatuais, ou pura e simplesmente Ditadura, não havia mais o que se discutir. Estava feito, e pronto.

Mas o que me traz aqui hoje não é o Decreto estadual de número 113, de 26/11/1930. É outro. Vejam, até nos dados históricos do IBGE, e em um sem número de publicações, assim se menciona:

"Elevado a cidade com a denominação de João Pessoa, por decretos estaduais nº 113, de 26-11-1930 e nº 3468, de 17- 03-1933".

Num dos dias que eu estava pesquisando a história mimosense, dessa vez folheando os Diários Oficiais do Estado da década de 1930 que haviam disponíveis na Biblioteca Pública Estadual, resolvi procurar o segundo Decreto. O tal de número 3.468/1933. Queria eu transcrevê-lo - à mão, como sempre, pois era a regra na época; as coleções não estavam digitalizadas.

Para a minha surpresa, o referido Decreto não tratava de Mimoso do Sul, ou João Pessoa, nome oficial do Município nos anos trinta. Não tinha nada a ver com Mimoso. Procurei, então, em todos os Decretos daquele ano de 1933. Nada específico havia, à não ser o que tratava de toda a divisão administrativa do Estado do Espírito Santo para aquele ano de 1933. Avancei para 1934, retrocedi para 1932, reavancei para 1935 e 1936, voltei para 1930 e 1931. Não tinha nada.

(Continuo mais tarde, porque agora vou dormir)
--- Passam quatro dias ---
(Continuando, quatro dias depois...)
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É interessante: invariavelmente, eu não gosto do que escrevo, quando leio dias depois. Mas não mudo; deixo tal como escrevi, corrigindo às vezes apenas erros de concordância ou de ortografia. Não costumo revisar os textos, antes de postá-los. Gosto de escrever e publicar, de uma tacada só.
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E hoje, dia 30 de novembro, após a parada que dei quando escrevia o texto mais acima, reli o mesmo. Como sempre, não gostei. Mas vai ficar como está. Só que certamente não vai prosseguir como seria prosseguido, se eu conseguisse concluí-lo no mesmo dia que comecei a escrevê-lo.
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O fato é: o Decreto de n.º 3.468, de 17 de março de 1933, não trata de João Pessoa, nome oficial na época, ou de Mimoso do Sul, nome atual do Município. Esse Decreto trata do Município de Santa Teresa: foi quando a sede teresense foi elevada à categoria de Cidade; antes, era Vila.
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Procurei esse Decreto também, é claro, apenas para dirimir dúvidas e excluir possibilidades, dentre os Decretos federais. E não existe, também, Decreto federal, nem com esse número, nem com outro número qualquer, que trate de João Pessoa / Mimoso do Sul nesse ano de 1933, no tocante à alguma confirmação ou retificação do Decreto estadual de 1930.
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Enfim, é isso.
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IBGE, e outros órgãos, corrijam-se, por favor.
Ou então achem o decreto correto, porque eu não consegui encontrá-lo.
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Gerson Moraes França
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Fontes -
Uma "porrada" de Diários Oficiais:
Estadual (1930 a 1936) e federal (1930 a 1933)

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Cachoeira do Inferno - Phócion Serpa


Adquiri, recentemente, o livro Cachoeira do Inferno, de Phócion Serpa. Consegui a obra original, autografada pelo autor, junto a uma Livraria Antiquário, sediada em Juiz de Fora, Minas Gerais. Chegou-me pelo correio, e eu já li suas páginas por três vezes.

A obra é um romance histórico, ambientada na antiga povoação de Limeira de Itabapoana. Foi publicada em 1928, e seu autor é natural daquele povoado. Serpa nasceu em 1892 e passou a infância em Limeira, antes de seguir para o Rio de Janeiro, onde foi estudar medicina em 1912. Tornou-se competente médico e conhecido escritor, e radicou-se na então capital do país. Dedicou-se à cultura com a mesma paixão, talvez até com paixão ainda maior, com que dedicava-se à medicina.

O título do livro faz referência à cachoeira do Inferno, hoje também conhecida como cachoeira das Garças, no rio Itabapoana. A cachoeira fica bem perto do antigo povoado, rio acima. Aliás, ficava. Com a construção da hidrelétrica Pedra do Garrafão, em 2008/2009, onde antes corriam as tormentosas águas, hoje está exposto o leito granítico.

O romance conta, de modo triste e fatalista, a história da vida de alguns moradores do local. O pano de fundo é a Limeira de Itabapoana em decadência, que reforça as histórias das pessoas que viveram esses últimos dias de existência do povoado. Todos os "personagens" da obra são pessoas reais. A história começa quando o povoado ainda era próspero e movimentado, e desenrola-se pelos anos seguintes, retratando o ocaso do núcleo. Fala de pessoas que foram embora, e daqueles que insistiam em ficar, presos pelo apego ao torrão em que construíram suas casas. De si próprio, não fala o autor; deixa apenas estampado em palavras o que presenciou, nos primeiros anos de sua vida, quando testemunhou o abandono gradativo do núcleo aonde nasceu, já decadente quando de seu nascimento, segundo o próprio Serpa informa.

Deu bastante trabalho, mas eu consegui identificar os personagens do livro. Identifiquei o médico e sua filha, o tabelião, o professor, o boticário. O comerciante, ao que parece, Serpa usou um nome parecido, talvez para não expor a pessoa. O vigário, ao que tudo indica, também teve o nome modificado, e Serpa certamente usou de analogia para com a obra de Moreira Fraga (A Filha do Padre, romance, 1881).

A leitura da obra me tocou e emocionou. Isso porque estive ali, naquelas ruínas, hoje vazias e mortas. As histórias daquelas pessoas que lá nasceram, viveram e morreram, com seus sentimentos, esperanças, saudades e medos, me tocaram profundamente. Onde hoje não resta mais nada, à não ser ruínas, outrora moraram aquelas pessoas. Pisei no que um dia foram ruas, estive no que um dia foi um próspero porto, entrei no que um dia foi uma Capela que servia de ponto de encontro entre os locais e pessoas das vizinhanças. Capela esta, inclusive, retratada nas páginas do livro, que contam sobre sua construção e sobre sua reforma muitos anos depois.

O texto é escrito com linguagem rebuscada, com trechos um tanto poéticos, como era bem próprio para a época. Nada lacônico. Talvez isso saliente ainda mais a tristeza e o fatalismo da narrativa. Retratos das vidas de pessoas presas, pelo sentimento e/ou pela necessidade, à um povoado que se ia extinguindo.

Gerson Moraes França

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Foto Aérea do Sítio de Limeira do Itabapoana

Abaixo segue uma foto aérea do sítio aonde outrora erguia-se o Povoado de Limeira de Itabapoana. Tem tempo que quero postar essa foto, que foi retirada do Google Earth. A imagem é de 2010. Na parte norte, a margem espírito-santense; ao sul, a margem fluminense. Se quiser ampliar a imagem, basta clicar na mesma.


Podemos ver o começo das cachoeiras do Itabapoana ao lado esquerdo da foto. Na grande "meia lua" da margem direita (sul), ficava o Povoado de Limeira. Dá para ver, perto do rio, uma das ruínas escavadas pelos arqueólogos; outras não estão visíveis porque a grama já as cobriu em parte, ou porque estão embaixo de árvores. Por toda a extenção do sítio, quando lá estive, achavam-se espalhados restos de edificações, pedras de alicerces, tijolos, telhas e cerâmica.
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Do lado direito da foto, na margem esquerda (norte), podemos observar a pequena "esplanada" onde ficava a Limeira espírito-santense. Embora esse terreno tenha sido "varrido" por tratores, ainda existem alguns restos de fundação por lá. Quando lá estive, havia muitos cacos de cerâmica, tijolos e telhas na borda do rio; segundo informações dos locais, isso decorre do fato de tratores terem "empurrado a tralha" até ali, para "liberar o terreno".
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Gerson Moraes França

terça-feira, 19 de outubro de 2010

A decadência de Limeira, contada pelo Correio

Muito já disse eu, no BLOG, sobre Limeira de Itabapoana. Vários posts. Talvez (quem tem saco pra ler o BLOG) já esteja enjoado; mas eu, não! =)

O povoado de Limeira, importante dizer, cresceu na margem fluminense do rio Itabapoana. A "Limeira espirito-santense" era, digamos, apenas um pequenino "apêndice" daquela; só que do nosso lado do rio, cem metros abaixo. O núcleo e o movimento ficavam na margem campista. No rio Itabapoana, outras vilas espírito-santenses nasceram desse mesmo modo: Bom Jesus do Norte, que nasceu por causa da Bom Jesus fluminense, e Ponte de Itabapoana, que surgiu por causa da proximidade com a "ponta de trilhos" em Santo Eduardo, também no Estado do Rio. Inclusive, por muitos anos, Ponte de Itabapoana foi chamada de Ponte de Santo Eduardo.

A distância entre as margens fluminense e espírito-santense do rio Itabapoana, nesses pontos, é de pouco mais que 50 metros. Nada mais natural, pois, que os povoados nascentes não respeitassem nenhuma divisa estatal imposta. Os arraiais surgiam e cresciam indiferentes à isso. Como a "Limeira campista" era o núcleo mais movimentado, sendo a "nossa Limeira" apenas um "entreposto" ligado àquela, informo que no presente post escrevo sobre os correios na "Limeira principal". Para a época, porém, tanto fazia aos moradores locais se estavam aquém ou além do rio. Para eles, Limeira era um só povoado e pronto.

Com a chegada da estrada de ferro em Santo Eduardo, em 1879, Limeira sofreu um duro baque. Sua existência e prosperidade devia-se ao fato de ser um entreposto comercial decorrente de seu porto fluvial. Quando os trilhos chegaram em Santo Eduardo, pouco mais de dez quilômetros rio acima, o porto perdeu sua preponderância no escoamento de produtos. Limeira ainda seguiu como pequeno povoado por muitos anos, mas desde então foi decaindo, até desaparecer.

E podemos contar um pouco sobre essa decadência com os Correios! Limeira tinha uma agência dos correios que acaba retratando o ocaso da vila.

Em 1892, por exemplo, o serviço de correios era executado três vezes por semana, ligando a agência de Itabapoana (atual Ponte de Itabapoana) à Limeira. À título de informação, a Freguesia de Limeira era chamada, nessa época, com o pomposo nome de São Luiz Gonzaga da Limeira do Itabapoana.

Temos até os nomes de alguns dos agentes e estafetas que prestaram serviço na Agência do Correio em Limeira. Em 1891, era Manoel Machado da Silva o estafeta e condutor de malas do correio, entre Santo Eduardo e Limeira de Itabapoana, ocasião que foi exonerado à pedido. Em 1901, o agente do correio em Limeira era Antônio G. Maia de Azevedo. Em 1906, o agente Antônio Maia, de mudança, pede exoneração do cargo, e para seu lugar é nomeado Joaquim Lopes Pereira.

Mas este último sequer chegou à tomar posse. Sua nomeação foi declarada sem efeito, e a partir de 01 de agosto de 1906 "foi mandado cessar o funcionamento da Agência do Correio de Limeira do Itabapoana", e passou a ser "a correspondência encaminhada para a Agência de Santo Eduardo". Um estafeta continuou à executar esse serviço, pegando a correspondência deixada na caixa do correio que ficava na antiga Agência de Limeira e levando para Santo Eduardo. Mas a demanda era muito pequena para a despesa. Em 1913, foi definitivamente "suprimida a linha postal de Santo Eduardo à Limeira de Itabapoana, no Estado do Rio".

Assim, resta claro que, em 1913, não havia em Limeira número suficiente de moradores que justificasse a manutenção nem mesmo do serviço de estafeta e condução de malas. E isso sete anos depois de ter sido fechada a Agência do Correio local. Limeira, porém, não foi abandonada assim de "sopetão". Em 1927, quando Phocion Serpa escreveu seu romance ambientado numa já decadente Limeira, o povoado ainda tinha uns poucos habitantes. Em 1932, inclusive, no lado espírito-santense foram reformados dois armazéns de estoque, por causa da crise que abaixou o preço do café e aumentou o preço do transporte ferroviário. O rio Itabapoana chegou a ser desobstruído, e naquele ano alguns barcos levaram parte da produção de café rio abaixo, até a Barra do Itabapoana.

Mas esse foi apenas o último suspiro de esperança para Limeira. Já no ano seguinte, com a Leopoldina adequando o preço do frete, o escoamento do café volta todo para os trilhos. Para azar do empresário Carlos Larica, que reformou os referidos armazéns e executou ele mesmo o serviço de desobstrução do rio.

Hoje, de Limeira só restam ruínas (foto de 2002, do autor)

Gerson Moraes França

domingo, 3 de outubro de 2010

O Início da História de Mimoso do Sul

Em cima e à esquerda, a casa que servia de sede da Fazenda Mimozo. No centro, o terreiro para secar café. Embaixo, outras edificações do complexo da fazenda. A antiga sede não existe mais.


Quem já procurou ler, com algum pormenor, os tempos primeiros da história de Mimoso do Sul, já se deparou com esse texto:

"A sede atual, sua história nasce no dia 11 de outubro de 1852. Quando o Capitão Pedro Ferreira da Silva compra de José Lopes Diniz em Campos —RJ, junto ao tabelião José Francisco Correa, a Fazenda do Vale Mimozo (da Fazenda Palestina até o Porto da Limeira)". [texto de autoria de Rosângela Guarçoni]

Sempre tive muita curiosidade para saber algumas coisas sobre esse evento acima descrito. Quais foram as motivações que levaram o capitão Pedro Ferreira a sair lá de Oliveira/MG e vir ter à região da mata do sul do Espírito Santo? Quem foi José Lopes Diniz que, afinal, teria chegado antes de Pedro Ferreira, uma vez que vendeu as terras para este? Muitas interrogações!

O fato cru, em si, não me deixava satisfeito. Então, "garimpei" algumas informações, no decorrer desses anos de pesquisa sobre a história local mimosense. E aqui colocarei um pouco do que consegui encontrar. Só não citarei, ainda, as fontes, porque quero um dia publicar algo sobre isso, impresso. Na obra estarão elencadas todas as fontes. E apenas para título de informação: nenhum dos documentos que me serviram de fonte foram encontrados em Mimoso do Sul.


CAPITÃO PEDRO FERREIRA DA SILVA

Pedro Ferreira da Silva nasceu no então arraial de Nossa Senhora da Oliveira, atualmente municípo de Oliveira, em Minas Gerais, no dia 30 de novembro do ano de 1816, filho de Pedro Luiz Ferreira e Felizarda Rosa Ribeiro da Silva. Seu pai, natural da Ilha Terceira, nos Açores, foi Alferes e grande proprietário de terras em Oliveira. Sua mãe era filha do capitão José Ribeiro de Oliveira e Silva, que esteve em Goiás, minerando ouro, antes de se fixar no arraial surgido no caminho conhecido como "picada de Goiás", onde os viajantes pousavam.

Em 1842, estoura em Minas Gerais a rebelião conhecida atualmente como "revolução liberal". Em Oliveira, já então vila e sede de Município, os insurgentes rapidamente dominam a situação. Pedro Ferreira e sua família ingressam nas hostes rebeldes. Derrotado o movimento e restabelecida a ordem, ainda no ano de 1842, Pedro Ferreira e seu irmão Bartholomeu estão entre os implicados na revolta. Em 1844, os participantes do movimento são todos anistiados pelo Imperador. Mas as perseguições por parte de alguns dos vencedores acabam por fazer Pedro Ferreira tomar a decisão de ir embora de Oliveira.

Na esteira dos fatos, um conflito familiar acaba por sedimentar essa decisão. Pedro e seu irmão Bartholomeu se desentendem por questões patrimoniais. E tomam rumos diferentes. Bartholomeu adquire terras na região do atual triângulo mineiro, e Pedro compra terras no "rio Muquy do Itabapuanna", adquiridas junto à um posseiro. Só viriam fazer as pazes muitos anos depois.

Ao que parece, Pedro Ferreira da Silva tomou posse de suas novas terras e formou sua fazenda entre abril de 1854 e fereveiro de 1856. Na primeira data citada, há relato de que escravos de seu sobrinho estavam sendo deslocados de Oliveira para o Itabapoana. E na última data há documento que prova que o capitão Pedro Ferreira já estava estabelecido com seus escravos em suas novas terras no Espírito Santo. Em 1857, com a criação do "Districto Policial da Barra do Muqui" e do "Districto de Paz do Caxoeiro do Itabapuanna", o capitão Pedro Ferreira da Silva foi nomeado em maio/57 para o cargo de Subdelegado, sendo a primeira autoridade estatal da região.
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As terras de Pedro Ferreira eram muitas, e no começo este ficou estabelecido mais próximo ao Itabapoana. Foi apenas em 1858 que a região onde hoje está a cidade de Mimoso do Sul foi aberta como fazenda. Na ocasião, estava sendo contruída a primeira estrada ligando Cachoeiro do Itapemirim ao Cachoeiro do Itabapoana. Nesse ano, já com a picada toda terminada e com boa parte do caminho "prestando trânsito", o capitão Pedro Ferreira iniciou a exploração da que se tornaria sua principal propriedade: a Fazenda Mimozo. Era justamente nesse ponto que foi construída a primeira ponte sobre o rio Muqui do Sul, de passagem obrigatória para os que transitavam pela estrada. Em 1859, ao que tudo indica, já estava morando na sua nova sede, embora a grande edificação que serviria de sede da fazenda, por muitos anos, fosse concluída somente por volta de 1870.

Já sobre o mateiro José Lopes Diniz, que vendeu as suas posses para o capitão Pedro Ferreira da Silva em 1852, vou falar num próximo post; o presente acabou ficando grande demais.
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Gerson Moraes França

sábado, 2 de outubro de 2010

Aldeia de São Pedro e Limeira do Itabapoana - mais um pouquinho

Que tal retornarmos, agora, aos tempos mais antigos, antes mesmo dos primórdios da colonização do hinterland das terras que atualmente pertencem ao Município de Mimoso do Sul?

Em outro post, aqui falamos sobre a "fundação" da pequenina aldeia de índios tupis, sob a direção dos jesuítas de Neves e Muribeca, no século XVII, chamada de São Pedro Apóstolo. Importante salientar que nunca houve uma "fundação oficial" para essa aldeia. Seu estabelecimento foi decorrente da "espalhada" dos índios tupis que foram levados, pelos jesuítas, quando estes fundaram a Fazenda Muribeca e a Capela de Nossa Senhora das Neves, no baixo Itabapoana, que atualmente ficam em terras do Município de Presidente Kennedy.

Assim, a aldeia de São Pedro não foi Missão, nem Fazenda, nem Sesmaria, sem nada congênere. Foi apenas um pequeno "arraial", formado quando os jesuítas reiniciaram com o cultivo de cana-de-açúcar na região. Logo e rapidamente, porém, o cultivo da cana foi abandonado, especializando-se a posterior fazenda da Muribeca na criação de gado, que abastecia o Colégio jesuíta de Vitória. Esses índios que inicialmente povoaram a região das primeiras cachoeiras do Itabapoana, que séculos depois seria chamada de Limeira, eram todos provenientes da Aldeia de Reriritiba, atual cidade de Anchieta.

À exemplo de muitos povoados formados por índios aculturados e "caboclos mamelucos", como Piúma, Itaipava/Itaoca, Perocão, Meaípe, Santa Cruz e Riacho, São Pedro era um pequeno arraial onde os seus moradores praticavam pequena agricultura de subsistência, e que se dedicavam à pesca. Quando o eixo da atividade econômica da fazenda Muribeca deslocou-se definitivamente para a criação de gado, mais próximo ao litoral, alguns desses índios continuaram vivendo naquela aldeia. No século XVIII, os jesuítas acabaram adquirindo escravaria negra para as atividades da fazenda.

Sem nenhuma tutela formal, os moradores da aldeia de São Pedro lá sobreviveram em suas atividades de subsistência por cerca de dois séculos. Eram poucos; não mais que cinquenta, em seu início. Seu arraial parece ter sobrevivido à expulsão dos jesuítas, e até mesmo às investidas dos puris. Mas não parece ter sobrevivido aos posseiros, quando o médio e alto Itabapoana foram ocupados por fazendeiros fluminenses e mineiros. Por volta de 1.800, sua pequena comunidade não tinha mais que cinco casas; em 1.850, estavam já esbulhados pelos posseiros. Os caboclos que não se adequaram à nova realidade foram embora.

Existe um registro muito interessante, que foi "garimpado" por Márcia Malheiros e publicado em sua tese de doutorado, "Homens da Fronteira - Índios e Capuchinos na ocupação dos Sertões do Leste, do Paraíba ou Goytacazes", de 2008. Discorrendo sobre a chegada de índios de outras localidades da aldeia de São Fidélis, predominantemente puri, cita na página 294:

"Há também o registro de batismo de Geralda, 'índia', cuja mãe, Claudina do Espírito Santo, foi identificada como proveniente da 'Aldeia de São Pedro do Norte'. Ainda que não tenha sido possível localizar essa Aldeia, pergunto-me o que esta mulher, vinda provavelmente de outro aldeamento, 'mãe solteira', estava fazendo na Aldeia de São Fidélis, em 1840.
Esta, sem dúvida, é mais uma pergunta de difícil resposta. Não há menção sobre os avós maternos de Geralda, filha de pai também incógnito. Os padrinhos escolhidos por sua mãe, registrados sem identificação étnica, também não fornecem qualquer pista.
(...)"

É apenas hipótese, claro, mas é plausível crer que Claudina, apelidada "do Espírito Santo", e proveniente da "Aldeia de São Pedro do Norte", sem identificação étnica que não "índia" (assim como se classificavam os antigos índios tupis aculturados), já presente na Aldeia de São Fidélis em 1840 (quando gerou Geralda), tenha lá chegado alguns anos antes, vinda da aldeia de São Pedro. A data também é bem sintomática - a primeira posse, já no hinterland das terras atualmente de Mimoso do Sul, data de 1.837.

O nome "São Pedro" acabou sendo preservado no rio que deságua perto da antiga aldeia, rio no qual, em suas cabeceiras, surgiria anos depois o primitivo arraial de São Pedro do Alcântara, que se transformaria posteriormente na sede do antigo Município de São Pedro do Itabapoana.

No curso da década de 1.840, a localidade passaria a ser chamada de Limeira. Há registro dos proprietários da localidade, na década de 1.850: Manoel Marques de Souza (do lado do Estado de Rio de Janeiro) e a viúva Maria Angélica de Abreu Lima (do lado do Espírito Santo). Tornou-se o porto de onde se escoava, rio abaixo até a barra, toda a produção de café do médio e alto Itabapoana. Cresceu, e de arraial tornou-se povoado e paróquia.

Ainda não se pode afirmar o porquê do nome "Limeira". Seria porque haviam muitas limeiras na localidade? Não é impossível; afinal, foram quase dois séculos de ocupação por famílias de pescadores que tinham pequenas lavouras de mantimentos e subsistência. Mas é apenas mera hipótese. A fazenda de Manoel Marques de Souza já era classificada como sendo em "Limeira do Itabapoana", mas ainda não é possível saber se foi ele quem cognominou, ou não.
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Gerson Moraes França

terça-feira, 14 de setembro de 2010

O Banco do Brasil e a pecuária em Mimoso do Sul

Ora, vejam; quase três meses sem desenvolver um novo texto para o BLOG. Mas que desrespeito para com os leitores!!! (risos) Mas a explicação é bem simples: estou acelerando a confecção do livro que pretendo terminar ainda nesse ano, de preferência no início de novembro. Assim, estou dedicando meu tempo livre para atingir esse fim.

No dia 23 de junho havia eu iniciado um escrito sobre o Banco do Brasil, e o incentivo que este deu ao desenvolvimento da pecuária em Mimoso do Sul, em detrimento das lavouras de café, já amparadas por financiamentos e créditos de outros bancos públicos e privados. Minha vontade era colocar lá dados de minhas pesquisas, pois possuo os números da evolução da pecuária e das pastagens em Mimoso, desde a década de 1920 até os dias atuais. E, concomitante, colocar algo sobre o incentivo que a recém inaugurada agência do Banco do Brasil prestou aos pecuaristas.

Meus arquivos são grandes e, o que é pior, bagunçados. Não tive tempo (e nem saco) para procurar os dados. É provável que, em EDIT futuro, eu aqui coloque as informações. Mas, por hora, vai somente isso: durante a década de 1940 e 1950 a pecuária aumentou muito o seu espaço em Mimoso do Sul, principalmente nas terras mais baixas. Esse fator foi muito importante para minimizar, no final da década de 1960, o impacto que a política de erradicação dos cafezais provocou no Município.

Posto, então, apenas um pequeno texto, com colocações de um dos primeiros funcionários do Banco do Brasil em Mimoso do Sul. Observa-se uma visão progressista, de olho no futuro, deste funcionário que logo se tornou o gerente da agência.

O nome desse funcionário era José Andrade de Souza. Chegou em Mimoso em 1942, quando foi inaugurada a agência do Banco do Brasil em Mimoso do Sul. Chegou como sub-gerente. No mesmo ano, tornou-se o gerente da agência. Tinha apenas 22 anos, na ocasião.

José ficou dez anos à frente da Agência de Mimoso. Foi embora em 1952, quando foi transferido para Pirassununga, em São Paulo. Quando chegou em Mimoso e assumiu a gerência, o café imperava na economia local; a pecuária, embora existente, era de pequena monta comparada aos cafezais.

A equipe da agência do Banco do Brasil em Mimoso do Sul - 1950


Segundo José, suas previsões de crescimento para a cidade se concretizaram, ao final desses 10 anos. Não através da lavoura cafeeira, muito maltratada por falta de orientação técnica antes da chegada do Banco, mas graças à pecuária, que logo virou um dos pilares fortes da economia local com o apoio do Banco do Brasil aos criadores. José disse em entrevista prestada à Revista VEJA, em 1978: "Para você ter uma idéia de como o Banco foi importante para aquela gente, basta dizer que quando saí de lá fui abraçado por vinte afilhados".

José Andrade de Souza cita também alguns fatos pitorescos.

Um agricultor local, "Para provar que tinha crédito, me apresentou suas promissórias: - quatro quilos, doutor; um eu pesei agora -. Isso aconteceu em Mimoso do Sul, no Espírito Santo, quando eu trabalhava na subgerência local do Banco do Brasil. Por sinal, tinha 22 anos quando fui convocado para sua gerência".

"Lembro que cheguei lá e fui direto à uma firma de café explicar que a gerência ia ser instalada. Disse que devia fazer o cadastro da praça e fiz um discurso sobre a riqueza da região. Aí um dos sócios da firma interrompeu-me: - Está bem, temos certeza que a agência do BB dará bons resultados. E quando é que vem o gerente? -".
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Investindo no financiamento e na ajuda financeira e técnica aos pecuaristas, o Banco do Brasil em Mimoso do Sul ajudou à cimentar uma importante atividade econômica do Município. E isso numa época que o café, embora já decaindo em sua primazia, era o carro forte econômico local. Visão progressista e de longo prazo, que muito beneficiou Mimoso do Sul, e que foi importantíssimo para minimizar os efeitos que a erradicação dos cafeeiros produziu localmente.
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Gerson Moraes França
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Fontes:
Revista Veja - ed. 507 - 1978
Foto: "Mimoso do Sul, um município em revista" - 1951

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Estou escrevendo um texto para o BLOG, tratando da "virada" do norte do Banco do Brasil em Mimoso do Sul, na década de 1940. Nessa época, o café imperava como principal atividade econômica do Município; mas a gerência do BB em Mimoso, com uma visão progressista e futurista, resolveu financiar a pecuária local. Considerando a erradicação dos cafezais na década de 1960, essa medida pregressa ajudou a minimizar o impacto da execução de tal política em Mimoso do Sul.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Agente(s) ianque(s) em Mimoso

Dez pessoas foram presas nos Estados Unidos, no último dia 27 de junho, acusadas de serem espiões russos. O décimo primeiro suspeito, que estava foragido, foi preso hoje no Chipre quando tentava embarcar para a Hungria; deverá ser extraditado nos próximos dias. Segundo os norte-americanos, os supostos espiões residiam nos Estados Unidos a muitos anos, vivendo como pessoas comuns, e seriam resquícios da época da "guerra fria".

Tal fato me fez lembrar de algo que pesquisei a pouco tempo, e que envolve suposta espionagem, fruto das "lutas ideológicas" da guerra fria, em Mimoso do Sul.

Sim, caro leitor! Os Estados Unidos da América mantiveram ao menos um "agente" em Mimoso do Sul, embora não seja possível ainda afirmar (e provar) até que ponto esta pessoa se imiscuiu em espionagem. Um fato, porém, é inconteste: análises de conjuntura ele certamente executou, e as remeteu ao seu país.


OS CORPOS DA PAZ

A vigilância e interferência ianque no Brasil durante a primeira metade dos anos de 1960 são matéria já bastante estudada e comprovada. Após a revolução em Cuba em 1959, e a permanente "ameaça comunista" na América Latina, os Estados Unidos adotaram políticas para frear qualquer avanço dos comunistas em seu "quintal". A atuação do IBAD nas eleições de 1962 com financiamento de campanhas, a participação de diplomatas norte-americanos na conspiração que derrubou Goulart em 1964, o plano para despachar uma esquadra da Marinha norte-americana caso houvesse guerra civil, dentre outras coisas mais, são fatos hoje já provados.

E uma das instituições norte-americanas que até hoje ainda causam alguma polêmica, no tocante à sua atuação no Brasil, são os Peace Corps, os "Corpos da Paz". Nascidas quando da assunção de Kennedy nos E.U.A. em 1960, eram uma espécie de coorporação de voluntários que iam residir em países do "terceiro mundo", para executarem ações de assistência, educação, sociais, dentre outros propósitos humanitários. Tinham objetivos humanistas e assistencialistas, embora defendendo o ideal liberal norte-americano contra as idéias comunistas.

Milhares de voluntários dos Corpos de Paz desembarcaram no Brasil, justamente na época que o Governo Goulart começou a radicalizar para a esquerda, na esteira de outros movimentos de caráter sindicalista ou comunista: 4.968 em 1962 e 2.463 em 1963, ano que o Governo começou à desconfiar da real intenção das Peace Corps e restringiu a concessão de vistos. Assim, muitos entendem que esses voluntários eram, na verdade, apenas fachada para uma operação de inteligência e infiltração muito mais elaborada. Hoje, sabe-se que muitos deles estavam realmente imboídos de espírito humanitário legítimo, embora pregando o ideal liberal norte-americano concomitante às suas ações de campo, fazendo um contraponto ao comunismo. Sabe-se também que, dentre eles, haviam também agentes e até espiões.


AS PEACE CORPS EM MIMOSO DO SUL

A primeira leva de voluntários dos Corpos da Paz que desembarcou no Estado do Espírito Santo chegou em março de 1963. Seus elementos foram treinados na Universidade do Novo México, e vieram para implementar no Estado o School Lunch Program, ou "Programa de Merenda Escolar". Depois foi implementado o Community Development Program, ou "Programa de Desenvolvimento da Comunidade", dentre outros mais. Os voluntários recebiam vultosa quantia em dinheiro para executar os programas, e se fala na cifra de 75 mil dólares mensais para alguns deles.

Em 1965, os Corpos da Paz enviaram para Mimoso do Sul um de seus voluntários. Era John Williams, treinado em junho de 1965 na Universidade de Georgetown, Washington D.C. Chegou em Mimoso no mesmo ano, para implementar os Programas de Merenda Escolar e de Desenvolvimento da Comunidade. Curiosamente, nessa época havia voluntários norte-americanos trabalhando em vários Municípios capixabas que possuíam importantes lideranças ligadas ao PTB, Partido Político do ex-Presidente deposto João Goulart.

No caso do Espírito Santo, 1965 foi um ano de sucessivas crises políticas, advindas das ações dos setores militares e civis mais radicais e contrários ao Governador Francisco Lacerda de Aguiar, o Chiquinho, aliado ao PTB. Esses setores denunciavam frequentemente desmandos e corrupção no Governo, buscando e forçando a destituição ou a renúncia de Chiquinho. O Vice-governador era, na ocasião, o mimosense Rubens Rangel, que foi presidente estadual do PTB.

Chiquinho não era comunista; embora seus opositores alegassem ligações suas com elementos esquerdistas, seu afastamento efetuou-se mais por uma questão de rivalidades políticas estaduais do que por alguma ligação ideológica com a esquerda. Rubens Rangel também não era esquerdista, e muito menos comunista; dentro do PTB, inclusive, fazia um contraponto com Ramon de Oliveira Netto, Deputado Federal do PTB cassado logo no primeiro ato do Governo Revolucionário. O fato de ter ficado contra as "reformas de base" de Goulart, e de ter apoiado Argilano Dario (PTB, depois um dos fundadores do MDB) para a Deputação Federal, em detrimento de Ramon de Oliveira, bem como os manifestos de apoio à Revolução de 1964 de seu grupo político mimosense, serviram para torná-lo "palatável" junto aos militares, que o engessaram, porém, com a imposição e a chancela do Secretariado.

Teria sido John Williams mandado à Mimoso do Sul com o objetivo de verificar a conjuntura política local, atrás de informações mais específicas sobre Rubens Rangel? Fato é que Chiquinho cedeu às pressões e renunciou em 1966, e Rubens Rangel assumiu o Governo com o aval dos militares e das forças civis ligadas à UDN e ao PSD. Na composição do Secretariado, o novo Governador formou uma equipe que contemplou essas forças, alocando militares e civis simpatizantes ou ligados ao "projeto revolucionário de 1964".

Em obra recente (Em nome da América - Os Corpos da Paz no Brasil), a escritora Cecília Azevedo cita um voluntário de nome John Breen, que foi remetido a Mimoso do Sul também em 1965. Seria ele o John Williams? Ou seria outro voluntário das Peace Corps em Mimoso? Seja qual for a resposta, fato é que ele presumia que sua alocação em Mimoso do Sul deveria ser por motivos político-ideológicos. Em carta que o mesmo despachou para os E.U.A., deixou ele claro que só conseguia imaginar como justificativa para sua missão na cidade a presença de um elemento soviético nas proximidades. Breen orgulhava-se por ser um "agente de propaganda do sistema americano", pois pregava genuinamente a democracia e a liberdade.

Abaixo segue trecho de suas declarações:

Eu sou simplesmente o embaixador dos EUA em Mimoso do Sul. (...) Tudo o que eu faço é o reflexo do meu povo e de meu país. Eu tenho que dar um bom exemplo 24 horas por dia. (...) Ninguém, incluindo eu próprio, pode apontar qualquer coisa que eu tenha feito por aqui e, ainda assim, eu tenho ouvido algumas declarações como essa: "John, quando você partir, nós vamos chorar e sentir sua falta". E eles são sinceros. Quando eu ouço isso, sinto que estou realizando algum tipo de missão, embora nunca tenha recebido nenhum treinamento para liderar uma "quadrilha" [dança de rua brasileira - adendo da autora] ao longo da rua principal, o que estarei fazendo neste sábado à noite, porque ninguém mais quer fazê-lo. Dessa forma, eu nunca sei para o que serei chamado em termos de promoção da amizade e boa vontade. O maior de todos os sacrifícios é abrir mão de toda a privacidade. (1)

A sua inserção na sociedade local, as suas atividades sociais, bem como a sua consciência de que ali estava para fazer contraponto aos ideais comunistas, em prol do ideal norte-americano, denotam claramente que, além de estar executando suas atribuições dos programas de assistência e de desenvolvimento, estava também executando uma missão de proselitismo e de vigilância. Não é possível afirmar que tenha desempenhado, também, missão de inteligência e/ou espionagem, mas é praticamente certo que tenha procedido com análises de conjuntura, enviando informes aos Estados Unidos.

Essa "missão dos agentes ianques" em Mimoso do Sul durou de 1965 a 1967. De espionagem e inteligência, ou não, o fato é que os Estados Unidos mantiveram em Mimoso do Sul um ou mais agentes das Forças da Paz em missão. E exatamente no conturbado período que Chiquinho resignou e que Rubens Rangel assumiu o Governo do Estado, o qual governou de 05 de abril de 1966 a 31 de janeiro de 1967.

FONTES -
Em nome da América: os Corpos da Paz no Brasil, 1999
Cecília Azevedo; Horácio Gutiérrez
(1) sobre voluntário em Mimoso: págs. 265 e 381
Outras obras sobre os Corpos da Paz no Brasil:
Raízes e rumos: perspectivas interdisciplinares em estudos americanos, 2001, Sonia Torres
Viagem incompleta: a experiência brasileira. A grande transação, 2000, Carlos Guilherme Mota
Site das Peace Corps que atuaram no Brasil:

domingo, 27 de junho de 2010

Homenagem a Clarindo Lino da Silveira

Meses atrás, fiz no BLOG uma brincadeira, registrando alguns dos "causos" contados pelos mais velhos, "causos" estes que serviram para escrever um texto que, obviamente, não se tratava de afirmação ou atestado, muito menos de fato histórico comprovado e verdadeiro. São apenas "causos" que os antigos contavam, sem nenhuma prova ou fundamentação fática. Assim, nem mesmo pode ser o texto classificado como anedota. Porém, penso ser interessante aqui registrá-los, pois fazem parte de nosso "folclore social", parodiando Sebastão Nery em seu termo "folclore político".
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O fato é que, dentre prós e contras - pois nós, os seres humanos, sempre seremos dotados e virtudes e defeitos - os prós dos personagens lá elencados elevam-se muito além de qualquer contra. E resolvi aqui prestar uma pequena homenagem, trazendo ao BLOG um discurso do então Deputado Dirceu Cardoso, tecido dias após ao falecimento de Clarindo Lino da Silveira, em 1966. São as palavras de um dos nossos maiores homens públicos que servirão, aqui, para fazer essa humilde homenagem a um dos mais importantes mimosenses da nossa história.
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Para ler a íntegra do discurso, basta clicar na imagem abaixo.

Gerson Moraes França

quarta-feira, 23 de junho de 2010

O primeiro automóvel de Mimoso

Não me lembro exatamente quando, mas lá pelos idos de 1998, nas "reuniões" que fazíamos praticamente todos os dias no Departamento de Cultura, veio a baila esse assunto: quem teria sido o proprietário do primeiro automóvel de Mimoso? Rosângela Guarçoni, Diego Meloni, William Minassa Júnior e eu, em "sessão deliberativa", discutíamos a respeito. Não faço a mínima idéia do porquê de termos iniciado aquele debate. A "tradição", segundo Rosângela, reportava que o primeiro automóvel mimosense havia sido de propriedade da família Costa; mas não havia nada que assim comprovasse.

Nessa mesma época tive acesso à um dos poucos documentos governamentais ainda preservados do Município de São Pedro do Itabapoana; eram fragmentos, algumas poucas folhas apenas, de um livro de lançamento de tributos municipais referentes à Agência de Mimoso. Esses fragmentos do antigo livro faziam parte do "acervo" dos poucos que ainda existiam, salvos que foram da fogueira pelas mãos de Rosângela Guarçoni. Como me referi em outro post, a grande maioria dos documentos que "entulhavam" espaços na Prefeitura foram incinerados na segunda metade da década de 1970, ou início dos anos 1980. Rosângela conseguiu salvar alguns documentos descartados, antes que o fogo os consumisse.

De posse dessas folhas, organizei-as de modo a colocá-las em "ordem lógica". Depois copiei, à mão, todos os dados lá constantes. Eram informações muito interessantes, pois lá estavam elencados todos os moradores do Distrito que exerciam profissão ou atividade comercial, bem como outros dados mais. Tais registros eram usados para a Prefeitura fazer o lançamento de tributos como o "imposto de indústria e profissão", dentre outros que eram de competência municipal. E, naqueles documentos, encontrava-se a prova que responde a pergunta que fazíamos: afinal, quem teria sido o proprietário do primeiro automóvel de Mimoso?

As primeiras estradas de automóveis na região do Distrito de Mimoso foram construídas em 1924 - em maio desse ano, o trecho Mimoso-Palestina, de 7 Km, já estava terminado, prolongando-se nos anos seguintes a construção da estrada de rodagem entre Mimoso e São Pedro. Antes, as estradas eram apenas carroçáveis. E, em 1925, o distrito de Mimoso já possuía 3 caminhões e 1 automóvel em circulação. A propriedade desse primeiro automóvel: Salustiano Costa e seu filho. Em 1928, este automóvel já estava em nome de Dionísio Costa, e mais outro lhe fazia companhia transitando pelas ruas mimosenses, de propriedade de Francisco Borges Ribeiro; e o número de caminhões já havia chegado a 10.

Assim, resta provado, documentalmente, que a "tradição" corrente corresponde aos fatos: o primeiro automóvel em Mimoso foi, realmente, de propriedade da família Costa. O veículo, provavelmente, seria como o da foto que ilustra o começo deste post. Um Ford modelo T Sedan 1924. Dionísio Costa é pai de Pedro Costa, que já foi Prefeito e é o atual Vice-prefeito de Mimoso do Sul.
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À propósito: o primeiro caminhão (hoje chamaríamos de caminhonete), que teria sido o primeiro veículo automotor de Mimoso, ainda não consegui desvendar de que foi: se de João Talyule ou se de Chrispim Braga. Ambos eram proprietários de caminhão no início de 1925.
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Gerson Moraes França

domingo, 20 de junho de 2010

Construindo Mitos Fictícios - Final

Para finalizar.
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Quando iniciei minhas pesquisas sobre Mimoso e São Pedro em fontes primárias, em 1997, logo comecei a notar que o que eu havia aprendido sobre a história da "mudança da Comarca" em 1930 não era exatamente como posto pela historiografia local. E, quanto mais eu pesquisava, mais ficava claro que os "fatos oficiais" da década de 1990 não correspondiam aos "fatos verdadeiros" de 1930.
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Os "construtores" dessa "nova versão subvertida" da história ainda estão vivos e atuantes, e por isso é mais difícil e delicado tratar dessa matéria. Como disse eu em post anterior, não é minha intenção ferir egos ou desmerecer o trabalho de ninguém; quero apenas registrar os fatos tais como realmente ocorreram.
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Certa vez, quando eu estava com 22 anos, mostrei à um historiador local alguns dos documentos que eu havia "garimpado"; eu estava entusiasmado pelos achados, e esperava uma reação também entusiasmada - afinal, acreditava eu que um historiador gostaria de conhecer os fatos, e acertar as lacunas e erros de nossa história. Qual foi minha surpresa quando a pessoa, olhando para os documentos, fechou séria a cara, e em tom meio contrariado disse:
"- Mas, vem cá; o que você pretende com isso?"
Eu respondi de forma simples, um tanto constrangido:
"- Escrever um livro."
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Foi o suficiente para eu nunca ser convidado, por essa pessoa, para participar de algum evento cultural em Mimoso do Sul. Em todos que fui, entrei de "bicão".

Construindo Mitos Fictícios - Parte 4

Continuando.

Como se processou essa subversão da história mimosense? Ela foi conscientemente construída? Ou foi apenas obra do acaso e do esquecimento? Quando foi que ela se sedimentou? E por que conseguiu suplantar os verdadeiros fatos, tornando-se "realidade histórica"?

Responder a essas perguntas não é tarefa fácil, até porque envolve conceitos subjetivos. Mas, através da pesquisa empírica, tanto de documentos primários, quanto em entrevistas com os que viveram a época, é possível chegar à uma hipótese plenamente plausível.

Basicamente, na atualidade, considera-se o seguinte: Mimoso se desenvolveu por causa da estrada de ferro e, em 1930, pelo fato de ser getulista, enquanto São Pedro era "anti-getulista", foi criada a situação para se transferir a sede da Comarca, sacramentada pela força e ratificada pela Revolução. E determinadas personalidades foram elevadas à condição de "patrocinadores" desse ato. Esse é o resumo dos fatos hoje tidos como realidade histórica local.

Através de minhas pesquisas, constatei que as coisas não correram bem assim, nem em relação aos fatos, nem em relação aos protagonistas. Mas, como disse eu no post anterior, minha tese completa será revelada apenas quando da publicação da obra que presentemente estou escrevendo. Fato é que, ao que tudo indica, essa "mudança da realidade histórica" não foi construída propositalmente - foi fruto de uma soma de fatos, combinando a morte dos protagonistas com a falta de trabalhos históricos mais específicos sobre a matéria, passando pela extensão da realidade histórica vivida nas décadas de 1940 e 1950 que foi "transferida" e, mesmo, "transmutada retroativamente" para os longínquos anos 1930.

Retornemos ao foco.

Nas décadas de 1950 e 1960, muitos dos principais protagonistas dos acontecimentos de 1930 em São Pedro / Mimoso ainda estavam vivos. Nesta época, o principal historiador do Município era o Dr. Olympio de Abreu, que chegou a ser Prefeito Municipal, Secretário de Estado da Fazenda e encerrou sua atividade política no CADE, já na década de 1970. Nos escritos históricos sobre Mimoso, nessa época, ainda não havia sido lançada ou construída a subversão histórica hoje considerada. A explicação para isso é muito simples: pessoas que viveram os fatos de 1930 estavam vivas, muitas delas atuantes politicamente, e subverter a realidade historiográfica seria tarefa praticamente impossível. Não havia sequer intenção de mudar ou construir nova realidade. O próprio Dr. Olympio de Abreu estava com 17 anos quando houve a mudança da Comarca, e seu pai foi um dos protagonistas políticos naquela época.

As coisas começaram a mudar a partir da segunda metade da década de 1970. Com todos os protagonistas já falecidos, e sem trabalhos retratando em pormenores o movimento de 1930 no Município, criou-se uma espécie de "vácuo", que precisava ser preenchido. A falta de novas pesquisas em documentos primários era suprida por novas "traduções" de fontes secundárias, como a famosa "Revista de 1951". Foi quando se construiu, sem propósito escuso - ressalte-se -, a nova "realidade histórica". Estou convencido que essa subversão não se deu de forma arquitetada e consciente, mas sim de modo bem intencionado e meramente especulativo. Por fim, entrevistas realizadas com descendentes dos protagonistas, alguns que nem nascidos eram ainda em 1930, acabaram por dar forma e cristalizar a nova "tese interpretativa", que se sacramentou como realidade histórica na década de 1980, na época da criação do Sítio Histórico de São Pedro do Itabapoana.

E assim passamos a ter uma "nova verdade" para os pouco conhecidos e estudados fatos históricos locais de 1930.

Continua no próximo post.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Construindo Mitos Fictícios - Parte 3

Continuando.

Não é nossa intenção ferir egos, muito menos desmerecer a contribuição que nossos historiadores locais deram para a preservação de nossa memória. Se ainda temos pouca coisa, ao menos temos alguma coisa: e isso é fruto da dedicação e do trabalho que algumas pessoas desprenderam em prol da história de Mimoso do Sul. Antes algo, do que nada. Inclusive, tecemos alguns comentários acerca desses heróis que preservam nossa história; tal escrito pode ser lido clicando nesse LINK.

Mas, a despeito das palavras supra aludidas, não podemos fechar nossos olhos e deixar de corrigir equívocos, erros ou omissões. Se novos documentos trazem fatos novos à luz, se novas pesquisas trazem a tona algo que corrija alguma coisa, é nosso dever de pesquisador reproduzir esses achados, e acertar o que está desvirtuado. Obviamente, desde que devidamente fundamentado. Assim, estaremos dando nossa contribuição de forma benéfica, pois a busca da verdadeira história é o objetivo maior de qualquer pesquisador.

Mas não tratarei aqui dos fatos em si. Esses documentos, esses fatos, essas correções, são objeto de um trabalho que estou presentemente escrevendo, e que em breve será publicado. Desse modo, não posso explicitá-los neste espaço, porque, se assim eu fizer, estarei adiantando a essência e o objeto principal de minha futura obra. Minha intenção é publicar o livro no dia 26 de novembro de 2010, data referencial de Mimoso do Sul, pois se trata da data em que foi devidamente formalizada a nossa situação político-administrativa pós movimento de 1930. No corrente ano estamos completando o 80º aniversário dos acontecimentos.

Para adentrar na seara que pretendo expor, é preciso deixar claros alguns conceitos. Embora, na década de 1980, tenha sido feito um esforço para transformar a "Mudança da Comarca" em um acontecimento de continuidade, como se São Pedro e Mimoso fossem simplesmente parte de um processo uno e de transição, o fato é que houve ruptura traumática. Essa ruptura, levada a efeito pela força, é característica que permanece entranhada na tradição e no consciente (e também no inconsciente) coletivo mimosense. Tal ruptura, pelo fato em si, tornou-se algo tão cristalizado e sedimentado, que não houve quem conseguisse transformá-la em algo brando. O jargão de que "todo mimosense era um são-pedrense até 1930, e que todo são-pedrense tornou-se um mimosense após 1930", construído intelectualmente na década de 1980 para fomentar uma identidade coletiva e fundamentar um processo histórico de continuação e transição, não conseguiu sepultar a noção de ruptura traumática.

A historiografia mimosense subverteu alguns fatos e papéis de protagonistas, mas nunca logrou êxito em sedimentar novo "sentimento" em relação ao fato "Mudança da Comarca". As expressões "roubo da Comarca", por parte dos são-pedrenses, e "tomada da Comarca", por parte dos mimosenses, são marcas visíveis dessa dicotomia. Embora hoje, de fato, passados tantos anos, são-pedrenses e mimosenses sejam parte de um ente uno e compartilhem uma identidade comum, essa dicotomia mantém-se firmemente viva na memória da sociedade local.
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Continua no próximo post.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Construindo Mitos Fictícios - Parte 2

Continuando.
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No curso da leitura do livro de Fernando Achiamé, "O Espírito Santo na Era Vargas (1930-1937)", logo me deparei com as "verdades cristalizadas" referentes à mudança da Comarca de São Pedro para Mimoso, em 1930. Abordando um tema amplo, com prazo definido, circunscrito à todo o Estado, é perfeitamente compreensível que o grande autor buscasse, ao menos em matérias locais interioranas de temas específicos, as fontes secundárias existentes. Em relação à São Pedro / Mimoso, Achiamé consultou algumas das obras conhecidas, e entrou em contato com uma historiadora local, Rosângela Guarçoni, em 2005. Bebeu dessas fontes para reproduzir, em seu trabalho, a "verdade cristalizada" acerca dos acontecimentos de 1930 em nosso Município atual de Mimoso do Sul.
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Achiamé não cometeu erro algum, em relação à São Pedro / Mimoso: apenas retratou em sua obra um "erro histórico" hoje sedimentado, que vem sendo construído e incrementado através dos tempos. Importante também salientar que estou aqui focando no assunto específico "mudança da Comarca em 1930", pois os temas abordados por Achiamé são muito mais amplos e abrangentes. E, com muita propriedade, o autor foi excelente em sua pesquisa e em seu trabalho, considerando o todo - e, também, quem sou eu para criticar o mestre?
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[Abrindo adendo: Alguns acontecimentos da revolução de 1930 no Estado do Espírito Santo acabaram se sedimentando como fatos "quase verdadeiros". É o caso, por exemplo, da invasão e ocupação de Afonso Cláudio, por forças mineiras. Uma declaração de João Punaro Bley, que se encontrava no Estado quando das operações de 1930, em suas memórias, induziram vários historiadores ao erro. Constatei em minhas pesquisas, em fontes primárias e secundárias, que João de Calhau não esteve em Afonso Cláudio. Lá estiveram foram os "soldados" arregimentados por Calhau em Ipanema/MG, que foram colocados à disposição do Comando Revolucionário do setor do Vale do Rio Doce, que os despacharam para operar no alto Guandú. Mas isso é outro assunto]
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O exemplo de "equívoco" no adendo acima também aconteceu em relação à São Pedro do Itabapoana e Mimoso, embora de modo diferente. As versões construídas através dos tempos foram mudando a realidade, de forma à subvertê-la em grande parte. Se em Afonso Cláudio o equívoco foi circunstancial, não desvirtuando substancialmente realidades e fatos, em Mimoso do Sul a "nova construção da realidade" redefiniu fatos e atuações de personagens. Enfim: mudou-se a história, tal como ela aconteceu realmente. Perrepistas viraram getulistas; "carcomidos" viraram "aliancistas"; dentre outras aberrações menores ou menos relevantes.
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Consultando fontes primárias, contemporâneas aos fatos, bem como entrevistando várias pessoas que viveram os acontecimentos de 1930 em São Pedro e em Mimoso, consegui restaurar a história verdadeira, tal como ocorreu de fato. Foram anos de pesquisas. Em memória aos aliancistas são-pedrenses e mimosenses, é preciso trazer à tona a verdadeira história, e o papel dos personagens que a construíram. Sem ficções, e sem construir mitos fictícios.
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Continua no próximo post.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Construindo Mitos Fictícios - Parte 1

Na última quarta-feira, dia 09 de junho, o BLOG completou seis meses na web. Neste mesmo dia, estive na Biblioteca Pública Estadual para o evento de lançamento do novo livro de Fernando Achiamé: "O Espírito Santo na Era Vargas (1930-1937)". Interessado que sou na Revolução de Trinta - tenho grande pesquisa feita sobre a época, só faltando ainda escrever meu trabalho para publicá-lo um dia -, não poderia eu perder esse evento.
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Quebrado que estou, pois ainda me encontro desempregado, fui presenteado com um exemplar da obra; um amigo conhecido lá mesmo, chamado Marcelo Augusto Della, foi quem me fez o favor. Obviamente que peguei seu número de conta de banco para, assim que puder, depositar os 25 reais que custou o livro. Após, entramos na fila para colher o autógrafo do autor.
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Fernando Achiamé, ao autografar meu exemplar, olhou sorridente para mim e disse: "eu lhe conheço; já lhe vi, só não me lembro onde". E já tinha me visto mesmo, só não me recordo se na Biblioteca Estadual ou se no Arquivo Público - eu já o havia visto pesquisando, quando eu ia praticamente todos os dias nesses locais, e em uma ocasião conversei rapidamente com ele sobre triviais assuntos de história.
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Respondi: "bom, eu lhe conheço!" - afinal, quem é que gosta de história no Estado que não conhece o Fernando Achiamé? Conversamos muito rapidamente, enquanto ele autografava na contracapa do livro: "Para Gerson, que um dia estará assinando uma obra historiográfica". Fui embora por volta das 21:30 horas; Achiamé, que chegou na Biblioteca às 19 horas, ficou lá autografando até depois das 22 horas.
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Ao chegar em casa, iniciei a leitura. Li todo o livro, de 368 páginas, em dois dias. Devorei-o. Estou hoje fazendo a segunda leitura, mais pausadamente, estando já pela metade. Certamente vou ler esse livro muitas e muitas vezes ainda - como já fiz com várias obras de cunho historiográfico que merecem estar na galeria dos livros excelentes.
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Continua no próximo post.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Mimoso passou dos MIL


Sim, meus amigos! MIMOSO É MIL! Aliás, é mais de mil!

Ao terminar o ano de 2009, a Prefeitura Municipal de Mimoso do Sul estava com exatos 1.061 funcionários ativos na administração direta, afora os 24 da administração indireta (SAAE), e sem contar as poucas centenas de inativos. Essa foi a primeira vez, na história de nosso Município, que a Prefeitura passou do primeiro milhar de empregados.

Desse verdadeiro batalhão de servidores, 650 são estatutários, ou seja, são providos em caráter efetivo. Outros 123 são comissionados, e mais 288 são funcionários sem vínculo permanente, fruto de contratações temporárias, de funcionários celetistas ou outros meios de admissão.

Para se ter idéia do quão significativo é esse número de servidores públicos em um Município como Mimoso do Sul, basta dizer que quase 10% de toda a população economicamente ativa local trabalha, atualmente, para a Prefeitura mimosense. Em 2009, a P.E.A. de Mimoso do Sul estava em cerca de 12 mil pessoas. Esse grupo abocanha mais de 40% de toda a massa salarial do mercado de trabalho formal do Município.

Considerando que temos cerca de 5 mil núcleos familiares em Mimoso do Sul, temos uma média de uma em cada cinco famílias com alguém empregado na Prefeitura; e, nesse caso, como sabemos que a média não corresponde à realidade factual, temos algumas "afortunadas" famílias nucleares com até três pessoas trabalhando para o Município. E quando constatamos que mais de 50% da população economicamente ativa mimosense está ocupada na agricultura e na pecuária, tanto em empregos formais quanto em atividades de agricultura familiar, os dados são ainda mais estarrecedores.


EVOLUÇÃO

Em 1980, o Município de Mimoso do Sul estava com 23.275 habitantes. Nesse ano, o número de funcionários ativos trabalhando para a Prefeitura era de 117. No final do governo Pedro Costa, em 1982, havia 152 servidores ativos na folha de pagamento da Prefeitura. Durante todo o governo subsequente, de Benedito Silvestre, o número de funcionários ficou sempre próximo aos 150.

A situação começou a mudar a partir de 1989, quando Fernando Resende assumiu, sucedendo Benedito Silvestre. Nessa época, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, os Municípios passaram a deter maior autonomia política e financeira; e, também, somente através de concurso público passou a ser possível ingressar nos quadros efetivos da administração pública. Em 1991, Mimoso do Sul tinha 24.041 habitantes, e pouco menos de 300 servidores ativos. Dez anos depois, após os governos de Fernando Resende, Benedito Silvestre e Ronan Rangel, o número de funcionários, que já havia dobrado entre 1980 e 1990, quase triplicou.

No ano de 2000, Mimoso do Sul estava com 26.199 habitantes, e em 2001 o total de funcionários ativos da administração direta municipal chegou ao patamar de 885 pessoas; 543 deles eram estatutários, efetivos ou comissionados. Em 2004, quando a população mimosense girava em torno de 26 mil habitantes, um grande concurso público foi realizado, deixando abertas as portas para a efetivação de quase duas centenas de funcionários.

Em 2005, porém, esse concurso foi anulado pela nova administração, baixando o número de funcionários ativos para 415 pessoas, com 104 estatutários efetivos e 45 servidores comissionados. A realização de outro concurso público, todavia, elevou em 2006 o número de estatutários para 368, enquanto o número total de funcionários ativos e de comissionados mantinha-se estável, respectivamente, com 418 empregados e 50 em comissão.

Os problemas judiciais advindos da anulação do concurso de 2004, concomitante com a realização do concurso de 2006, acabou por gerar um efeito cascata no "inchaço" do número de funcionários. Em 2008, o número de ativos havia baixado para 293, com 260 estatutários e 29 comissionados; mas, no ano seguinte, com o reconhecimento judicial da validade do concurso de 2004, e a assunção da nova administração que não freou novas contratações, passamos dos MIL funcionários ativos.

Assim, no ano de 2010, quando Mimoso do Sul chegou aos 25.902 habitantes, batemos todos os recordes: 658 estatutários, 125 comissionados, além de mais 300 servidores celetistas ou temporários. 1.085 funcionários ativos da administração direta e indireta. Assim fica fácil "gerar emprego"...
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TABELA
Ano - População - Funcionários municipais ativos

1981 - 23.275 - 117
1991 - 24.041 - 293
2001 - 26.395 - 885
2010 - 25.902 - 1.085

Crescimento da população municipal (1980-2010): 11,3%
Crescimento dos funcionários municipais (1980-2010): 827,4%

domingo, 6 de junho de 2010

Satyro Ribeiro França - Biografia

Satyro Ribeiro França. Ou, mais comumente, Satyro França; como é hoje cognominada a rua onde estão situadas, atualmente, a Prefeitura e a Câmara Municipal de Muqui, cidade que fica no sul do Estado do Espírito Santo.

Ele é meu trisavô; sou um dos tantos, no meu caso da quarta geração, dos descendentes deste que foi um dos primeiros povoadores da região de Cachoeiro de Itapemirim, especificamente das terras hoje sitas no atual Distrito de Camará, antigamente São Gabriel, Município de Muqui.

Por um erro de grafia, algumas publicações (Telelistas, e inclusive a própria Prefeitura em alguns Editais) grafam o nome como "Satiro França", o que faz com que muita gente atualmente chame a rua de "Sátiro França"; mas a pronúncia correta é "SatYro", com sílaba tônica no "ty". Pode parecer bobeira, mas entendi por bem deixar isso aqui esclarecido.


BIOGRAFIA

NASCIMENTO E MUDANÇA

Satyro Ribeiro França nasceu em Paty do Alferes, então Freguesia (espécie de Distrito) do Munícipio de Vassouras, no Estado do Rio de Janeiro, no dia 12 de janeiro de 1858 (dia de São Satyro). Veio a luz na sede da Fazenda São Luís da Boa Vista, cuja casa-grande fora contruída pelo seu avô Luiz de França em 1840. Com a morte do avô e a abertura do inventário, em 1850, a grande fazenda de café é dividida anos mais tarde entre os herdeiros, cabendo a sede à Luiz de Moraes França.

Desde 1854 sua família havia adquirido terras no Rio Muquy, então mata virgem, na esteira de vários proprietários de Paty do Alferes que foram desbravar esta região sita no sul da então Província do Espírito Santo. Como no Vale do Paraíba, as fazendas eram cafeeiras. Satyro, ainda criança, só muda-se definitivamente para Muqui aos sete anos de idade, em 1865, quando as fazendas já estavam definitivamente formadas e suas edificações construídas.

A família Gomes Leal, muito ligada ao que é considerado o primeiro desbravador de Muqui, José Pinheiro de Souza Werneck, e ligada por laços de casamento com a família França, desbravou boa parte da região que atualmente pertence ao Distrito de Camará, chamado então de São Gabriel do Muqui. A viúva de Manoel Gomes Leal, Maria Victoria da Conceição Leal, também natural de Paty do Alferes, juntamente com seus filhos, filhas, genros e noras, dentre esses os França, fundaram várias fazendas: São Gabriel, São Luiz, Sant'Ana, Santa Rosa.


FAMÍLIA NA POLÍTICA

Abastados fazendeiros em Paty do Alferes, os Gomes Leal e os França envolviam-se fatalmente com a política em Vassouras. E não foi diferente em Muqui.

Até 1864, todas as terras recém colonizadas do médio vale do Itapemirim, incluindo aí o vale do Muqui, faziam parte da Freguesia e Município de Nossa Senhora do Amparo do Itapemirim, que hoje é a cidade litorânea de Itapemirim. Naquele ano, foi criada a Freguesia de São Pedro do Cachoeiro de Itapemirim, e em 1867 a Freguesia foi elevada à categoria de Município, com sede em Cachoeiro. As fazendas de Muqui passaram à fazer parte dessa nova Freguesia e Município.

O tio do menino Satyro, Antônio Gomes Leal, tornou-se "chefe político" da família, e foi por duas vezes Vereador na Câmara Municipal de Cachoeiro, nas legislaturas de 1871-1876 e de 1877-1882. Em 1880(?), Satyro França, já com 22 anos, casa-se com a filha de Manoel Gomes Leal, sua prima Emygdia França Leal. Seu pai havia falecido, quando seu sogro morre, em 1884. Satyro França "herda", então, e com o tempo, a "chefia política" da família. Torna-se um dos maiores proprietários da recém criada Freguesia de São João do Muqui, reunindo as fazendas que ele e sua esposa Emygdia herdaram (Sant'Ana, São Gabriel e São Luiz).


NA GUARDA NACIONAL

A Guarda Nacional foi uma força de segunda linha, auxiliar e paramilitar, criada em 1831 no período Regencial, para salvaguardar a Constituição de 1824 e a ordem pública interna. Com sua criação, foram extintos os antigos Corpos de Milícias, as Ordenanças e as Guardas Municipais. O termo "coronelismo", cunhado para designar o ápice do poder das lideranças locais durante a República Velha, advém das patentes da Guarda Nacional passadas aos potentados locais, cujo posto máximo era o de Coronel. Seus oficiais, sempre homens de posses, deveriam manter prontas suas "tropas", que basicamente eram formadas por seus agregados e parentes, sem nenhuma remuneração. Somente em caso de mobilização ou missão qualquer é que o Governo reembolsava os custos e gastos efetuados.

"A Guarda Nacional tinha forte base municipal e altíssimo grau de politização. A sua organização se baseava nas elites políticas locais, pois eram elas que formavam ou dirigiam o Corpo de Guardas". A Guarda Nacional era subordinada ao Ministério da Justiça, tanto no Império, quanto na República. Em 1918 ela foi transferida ao Ministério da Guerra, sendo desmobilizada em 1922.

Satyro Ribeiro França foi nomeado oficial da Guarda Nacional em Decreto de 30 de setembro de 1892, quando foi designado Alferes da 3ª Companhia do 16º Batalhão de Infantaria, no Quarteirão de São João de Muqui. Em 1908 já era Capitão, e em 21 de outubro de 1914 tornava-se Coronel. Um de seus netos me relatou que, quando pequeno, na década de vinte, não podia entrar em um paiol que havia na Fazenda Chave do Satyro; mas, curiosas que são as crianças, acabou por entrar e entender o motivo da proibição - o Coronel Satyro França ali mantinha as antigas armas que serviam à sua "tropa" da Guarda Nacional.

Seus filhos também foram agraciados com postos no oficialato da Guarda Nacional. Quando foi elevado ao posto de Coronel, Satyro tinha três de seus rebentos na força: José Mattos e Abdenago, elevados na mesma ocasião à Capitães; e Zamith, designado Alferes. Mesmo após a dissolução da Guarda Nacional, em 1922, Satyro e seus filhos mantiveram as patentes em caráter honorário. Seu filho José Mattos, inclusive, após a sua morte, "herdou" essa "patente honorária" e passou à ser chamado de Coronel José Mattos França - como era usual na época do "coronelismo".


GALGANDO POSIÇÕES

Conforme dito acima, Satyro França era, no início da República, o "chefe político" das família Gomes Leal e França na região de São Gabriel do Muqui, então pertencente ao Município de Cachoeiro do Itapemirim. Seus rivais na política local eram da família Rosa Machado. Até 1908, e de acordo com as circunstâncias políticas estaduais, essas duas famílias se sucederiam, de tempos em tempos, na liderança política na região.

Com o rompimento havido entre Henrique Coutinho e Muniz Freire, Jerônimo Monteiro foi alçado à Presidência do Estado, indicado em 1907 pelo primeiro, sendo eleito em 1908. Em Cachoeiro e em Muqui, os reflexos dessa querela política, com suas consequentes reacomodações, também foram sentidos. É nessa ocasião que Satyro França torna-se o "chefe político" do distrito, sendo eleito Juiz Distrital de São Gabriel do Muqui em 02 de fevereiro de 1908, e empossado em 23 de maio do mesmo ano. Passa, então, a controlar as mesas eleitorais locais, que eram importante meio de manter sob controle as eleições no distrito.

Em 1912 é criado o Município de São João do Muqui, desmembrado de Cachoeiro do Itapemirim. Em novas reacomodações pós governo Jerônimo Monteiro, e para evitar ter que se escolher uma das lideranças locais, Marcondes Souza e Geraldo Vianna resolvem não privilegiar nenhuma das partes, e Satyro França não tem seu nome contemplado na chapa para vereadores das primeiras eleições muquienses. Consegue, porém, emplacar o nome de seu filho, Abdenago França, no cargo de 3º Juiz Distrital.


ESTRADA DE FERRO

Episódio interessante a ser citado é a construção da linha da estrada de ferro que ligava Santo Eduardo, no norte do Rio de Janeiro, à Cachoeiro do Itapemirim. Em 1902 foi inaugurada a estação no Arraial dos Lagartos (atualmente a cidade de Muqui), que passou à ser chamado então de Muqui, nome dado à referida estação. Nessa época, a contrução da via férrea já estava a cargo da Leopoldina Railway. No prolongamento da estrada, que em demanda à Cachoeiro passaria pelas terras de Satyro França, foi celebrado um contrato entre este e a Cia. Leopoldina.

E o fato pitoresco é que Satyro, ao assinar o contrato, e em virtude das plantas aprovadas que exigiam a "limpeza" das áreas contíguas à estrada de ferro, fez uma exigência, que foi aceita e cumprida pela empresa: não aceitava ele o corte de uma grande árvore que ficava defronte à sede de sua fazenda São Gabriel. Por esse motivo, a linha foi, naquele ponto, deslocada ligeiramente uns poucos metros, de modo à permitir a "sobrevivência" da árvore, sob o compromisso que seria "vistoriada permanentemente" pelo proprietário da fazenda; isso porque a mesma ainda estava dentro da "área de segurança" da linha.

Em 23 de julho de 1903 o trecho que ligava Muqui à São Felipe (Atualmente Atílio Vivacqua, ex-Marapé), e que passava pelas terras de Satyro França, já estava concluído. No contrato também estava prevista a construção de uma "parada", ou "chave", para que as locomotivas pudessem "fazer aguada". A partir de então sua propriedade passou a ser chamada de "Chave do Satyro", e o mesmo transformou a simples parada numa verdadeira Estação, com plataforma para embarque e desembarque, casa para negócio e armazém para café e cargas.


POLÍTICA - QUERELAS E SEDIMENTAÇÃO

A "acomodação" levada a efeito em Muqui, por ocasião das eleições municipais de 15 de novembro de 1912, deixou Satyro França insatisfeito. Sentindo-se desprestigiado, e mesmo injustiçado, Satyro vê-se envolvido nas "lutas políticas" e querelas pela liderança de sua região. Achava ele que, por sua atuação local nas eleições que deram a vitória à Jerônimo Monteiro e à chapa monteirista para Vereadores em Cachoeiro em 1908, bem como à Marcondes Souza em 1912, merecia o devido reconhecimento e uma posição mais destacada nas composições quando da criação do Município de Muqui; e da querela à intriga, o passo é curto.

Tais "incômodos e desassossego de espírito", como ele próprio diria em 29 de janeiro de 1913, faz com que Satyro abandone as lides políticas; chega a anunciar a intenção de vender sua grande fazenda, pois sua vontade era apenas "o desejo de tranquilidade, simplesmente". Em agosto de 1913, numa reunião com o Marcondes de Souza e Geraldo Vianna, os desentendimentos são acertados. Marcondes compromete-se a criar um Distrito em São Gabriel do Muqui, e entregá-lo ao controle e liderança de Satyro, bem como contemplar um vaga na Câmara de Vereadores para um representante de sua família. E tal acordo é cumprido, na íntegra.


E SE TORNA UM CORONEL

Conforme dito mais acima, em 21 de outubro de 1914 Satyro Ribeiro França era nomeado Coronel da Guarda Nacional, coroando a sedimentação de sua liderança como "chefe político" da região de São Gabriel. Oficial da referida força desde 1892, agora era, "oficialmente", um Coronel.

Honrando o compromisso firmado, durante o governo de Marcondes Souza é criado o Distrito de São Gabriel do Muqui, 2º Distrito e parte integrante do Município, juntamente com o distrito sede. Foi criado pela Lei estadual n.º 986, de 24 de dezembro de 1914. Em 15 de agosto de 1915 são realizadas as primeiras eleições distritais, sendo José Mattos, filho de Satyro, eleito para o cargo de 1º Juiz Distrital. A posse dos Juizes Distritais e a instalação do Distrito foi executada em 18 de setembro de 1915, em cerimônia solene realizada na casa de José Mattos, contando com a presença das autoridades municipais.

Nesse ínterim, foi fundado o Cartório de Registro Civil, e foi construída a primeira Capela da Paróquia, cujo padroeiro não poderia deixar de ser o anjo São Gabriel. Em dezembro, o Coronel Satyro França foi nomeado Delegado do Distrito. Em 23 de março de 1916 são realizadas as eleições municipais: Satyro França é eleito Vereador à Câmara Municipal de Muqui, e seu filho Abdenago é eleito 1º Juiz Distrital de São Gabriel. Ambos tomaram posse em 23 de maio do mesmo ano.


ARMAS AZEITADAS

Em 1916 as eleições no Espírito Santo foram bem tensas. Dois grupos políticos digladiavam-se pelo controle da política estadual. Os Monteiro, cujo candidato era o irmão de Jerônimo, Bernardino, ambos ligados à Marcondes, tiveram que enfrentar uma dura eleição contra Pinheiro Junior, este apoiado pelo Governo Federal e por praticamente toda a representação federal do Estado. Cada grupo dizia ter vencido as eleições, e em várias seções eleitorais houve duplicata de atas. Após a tensão, o tumulto; e após o tumulto, a guerra civil. Batalhas em Alegre, em Cachoeiro, em Vitória, em Afonso Cláudio. O Estado está dividido em dois governos; Pinheiro Junior, que não conseguiu tomar de assalto o Palácio do Governo, transfere a "sua" capital para Colatina, enquanto Bernardino controla Vitória após dura resistência. Há constante ameaça de Intervenção Federal.

Em Muqui, os pinheiristas tem vários partidários. Na fazenda Santa Rita, recém adquirida pelo mineiro João Lobato Galvão, há concentração de um pequeno grupo armado, chamados pelos monteiristas de "capangas do Lobato". A situação em Muqui é tensa, durante a após as eleições de 23 de março. Delegado de São Gabriel, o Coronel Satyro França reúne sua tropa para manter a ordem no distrito. Os pinheiristas chamam-nos de "jagunços do Satyro". Após os ataques pinheiristas de abril à Alegre e à Cachoeiro, todos ficam em "prontidão"; mas com o recuo dos partidários de Pinheiro Junior nessas cidades, após ter o Governo do Estado mandado uma numerosa tropa da Força Pública, a situação vai se acalmando. Os "capangas do Lobato" são desmobilizados, enquanto os "jagunços do Satyro" continuam garantindo a ordem em São Gabriel do Muqui. No início de julho, com a situação tranquilizada, tudo volta ao "normal".

Essa foi a última vez que a tropa da Guarda Nacional comandada pelo Coronel Satyro França foi mobilizada, e também a última vez que as armas do paiol foram azeitadas e municiadas. Quando seu neto, alguns anos mais tarde, entrou no "paiol proibido", as armas deveriam estar guardadas tal como foram após a desmobilização dos "jagunços do Satyro" naquele ano de 1916.


DÉCADA DE VINTE

Nas eleições de 1920 novamente houve racha na política estatual. Dessa vez, porém, no seio do próprio "monteirismo": os irmãos Jerônimo e Bernardino entram em séria divergência, o que leva à novos combates, mas dessa vez circuscritos principalmente à capital do Estado. Em Muqui, a chapa para vereadores havia sido formada antes do rompimento, e Satyro emplacou o nome de seu filho José Mattos como Vereador à Câmara Municipal. Outro filho seu, Zamith, foi eleito Juiz do 2º Distrito (São Gabriel), mantendo o controle do mesmo.

Com as acomodações advindas na nova ordem "bernardinista", após a vitória da corrente de Bernardino sobre a de Jerônimo em nível estadual, José Mattos renuncia à vereança; Satyro então indica o nome de seu filho Abdenago para ocupar a vaga que era "de sua família". Em julho de 1923, com a elevação de Muqui à categoria de Cidade (até então, detinha a categoria de Vila), as vagas na Câmara aumentam de cinco para sete Vereadores; e Satyro França é eleito para ocupar uma das duas novas cadeiras na Câmara. As correntes políticas do Município não aceitariam a indicação de outro de seus filhos, de modo que Satyro França, que já estava "passando o bastão" para sua prole, teve de voltar à ocupar um cargo público.

Em 1924, novas eleições municipais. Satyro França é reeleito Vereador, e seu filho José Mattos é eleito Juiz do 2º Distrito (São Gabriel). A família França, chefiada pelo Coronel Satyro, continua controlando a situação em sua região, e mantendo sua vaga na Câmara e o controle do Distrito e das mesas eleitorais de São Gabriel do Muqui.


NA OPOSIÇÃO LOCAL

Em 1927 acontecem algumas reviravoltas na política estadual, impostas por circustâncias em nível federal. A reacomodação das forças políticas que dirigiam o Estado, como sempre, refletiam nos seus Municípios, e isso não era diferente em Muqui. E em São Gabriel do Muqui, o Coronel Satyro vê-se alienado do processo político eleitoral. Os antigos acordos são rompidos, e Satyro França é excluído na formação da chapa para Vereadores na eleição de 15 de novembro de 1927.

Em 1928 adere, então, à oposição que estava se formando em torno do nome de João Vieira da Fraga, em rivalidade com a corrente situacionista local chefiada por Gerando Vianna. São realizadas eleições para o cargo de Prefeito Municipal em 02 de dezembro de 1928; há duplicidade de atas, e denúncias de fraude por ambas as partes. As duas correntes proclamam-se vencedoras do pleito. Após uma série de decisões e recursos, e com a Prefeitura ocupada pelos partidários de Geraldo Vianna e Argemiro de Macedo, o Presidente do Estado manda empossar o candidato João Vieira Fraga como Prefeito Municipal; este tomou posse no dia 03 de janeiro de 1929.

João Vieira da Fraga, porém, estava em minoria na Câmara. Seus partidários, então, usando a legislação eleitoral, conseguem cassar ainda em 1929 o mandato de um Vereador alinhado com seus opositores, e passam à deter a maioria. Após tal fato, os outros Vereadores alinhados à Geraldo Vianna abandonam seus mandatos em 1930. Nessa ocasião, Satyro França volta à Câmara, eleito Vereador para preenchimento de uma das vagas abertas. Seu novo mandato, porém, não duraria muito: com o estouro e vitória da Revolução de Outubro de 1930, as Câmaras Municipais foram todas dissolvidas.

DÉCADA DE TRINTA

Com a vitória da Revolução de 1930, o controle político de Muqui retorna às mãos de Geraldo Vianna, que indica o nome de seu filho, Alcides Vianna, para ocupar o cargo de Prefeito, nomeado pelo comando revolucionário no Estado. Mas as rivalidades entre Geraldo e o recém empossado Interventor estadual João Punaro Bley logo refletem-se em Muqui. Em abril de 1931, definitivamente rompidos, Bley exonera Alcides do cargo de Prefeito, nomeando uma pessoa de fora para governar a "politizada e complicada" Muqui.

Nesse período pós-revolucionário, o Coronel Satyro manteve-se um tanto equidistante das lides políticas. Durante as lutas em outubro de 1930, permaneceu "neutro", sem tomar maiores ações em prol de nenhuma das partes, mantendo posição de neutralidade. Seu filho Abdenago, inclusive, era membro da Aliança Liberal em Mimoso, para onde havia mudado sua residência em 1924; seu neto Jadyr, estudante em Vitória na época, era simpático à causa revolucionária e tenentista. Há relato até de que um dos "tenentes" havia estado na Chave do Satyro pouco tempo antes de estourar a revolução, sondando Satyro e avaliando as condições políticas locais.

Essa "reaproximação oficiosa" com os Vianna e a "neutralidade" mantida por Satyro em 1930 foi "recompensada" em homenagem feita por Alcides Vianna, que em 1931 abriu a rua que foi batizada com seu nome, via onde atualmente estão sediadas a Prefeitura e a Câmara Municipal de Muqui. Alguns mais extremados passaram a chamar o Coronel Satyro de "adesista de última hora", enquanto eles próprios eram cognominados pela imprensa local, ligada à Vianna, de "carcomidos".


MORTE

No dia 25 de julho de 1932, com 74 anos de idade, faleceu o Coronel Satyro Ribeiro França, em sua casa na Chave do Satyro. Seu velório e enterro foram muito concorridos pelas pessoas das circumvizinhanças, estando presentes várias importantes personalidades da região. Os jornais do Estado prestaram as últimas homenagens, classificando-o como "abastado fazendeiro e chefe de família exemplar". Foi sepultado no dia seguinte, no cemitério de São Gabriel do Muqui, tendo discursado o amigo José Olympio de Abreu quando "baixava-se o corpo à sepultura, enaltecendo as qualidades do finado".


PROLE

Ao falecer, Satyro deixou viúva sua mulher Dona Emygdia França Leal, e sete filhos: Anthero, Eloya (casada com Alexandre Martins), José Mattos, Abdenago, Maria Marinha (casada com Zildo Nery), Ermida (solteira) e Zamith. Anthero e José Mattos eram casados com senhoras da família Caiado, de São Felipe (Marapé, hoje Atílio Vivacqua), dando origem à família Caiado França, que foi tradicional em Cachoeiro do Itapemirim. Abdenago era casado com uma senhora de São Pedro do Itabapoana, descendente da família cearense Cavalcati que havia migrado para a região. Ermida se casaria depois com um Duarte, e Zamith com uma Carvalho, ambas as famílias de Muqui.

Alguns de seus descendentes são até hoje lembrados pelas atividades que exerceram. José Mattos passou a chefiar politicamente a família, tendo sido dirigente do PSD em Muqui, sendo também um importante representante classista da lavoura na década de trinta e quarenta. Zamith também foi do PSD, foi Vereador em Muqui e esteve, interinamente, exercedo a Prefeitura local na década de trinta e quarenta. Seu neto Cely Carvalho França foi um conhecido médico em Muqui e Mimoso, e outro neto Jadyr França Martins um politizado advogado que fez parte da UDN nas décadas de quarenta e cinquenta, tendo sido Procurador Geral do Município de Vitória na década de sessenta e setenta. Jadyr foi irmão de Jurandy, professora que hoje dá o nome ao Jardim de Infância da cidade.


DESCENDENTES

Seguindo a linha de descendência, meu bisavô Abdenago França (chamado em Muqui de "Seu Bené França") voltou para Muqui em 1933, após ser aliancista em Mimoso e ter exercido, por lá, o cargo de membro do Conselho Consultivo nomeado em 1931 - as Câmaras estavam dissolvidas. Era casado com Gervizina Cavalcanti, natural de São Pedro do Itabapoana, e tiveram oito filhos, dentre eles meu avô Gerson, que fez o ginasial em Muqui em 1933. Em sequência decrescente de idade, seguem todos os filhos do casal: Ary, Cecy, Orly, Gerson, Ilza, João Baptista, Jésus e Maria Amélia.

Meu avô Gerson entrou no Banco de Crédito Rural na década de quarenta, e foi viver em Vitória, capital do Estado. Casou-se com minha avó Mariana David, filha de Carlos Paes David, que foi Vereador em Muqui nas décadas de quarenta e cinquenta. Meu avô Gerson faleceu em 1974, e em sua homenagem meu pai me deu seu nome quando nasci, em 1975; assim, não conheci o meu avô, mas com minha avó Mariana eu tive muito contato - ela faleceu em 2006. Gerson e Mariana tiveram dois filhos: Cora, hoje casada com Juracy Bassini, e Maerson, meu pai, que nasceu em Vitória no ano de 1949.

Meu pai estudou em Vitória e tornou-se engenheiro em 1973; casou-se em 1974 com minha mãe, Selma Moraes, natural de Muqui. Maerson e Selma tiveram dois filhos: eu, nascido em 1975, e minha irmã Gabriela, nascida em 1978. Separados meus pais em 1987, em 1989 meu pai juntou-se com Liege Guarçoni, natural de Mimoso do Sul, filha de Domingos Guarçoni, falecido em 1999 e que foi Prefeito em Mimoso na década de setenta. Meu pai e minha madrasta mudaram-se de Vitória para Mimoso em 1991, e se separaram em 2010; minha mãe vive em Vila Velha desde a mesma data.


COMPLEMENTOS E CORREÇOES MAIS TARDE
EDIT - complementos e correções
Um bispo missionário: dom Fernando de Sousa Monteiro, C.M.
Maria Stella de Novaes - 1951 - 266 páginas
"Do próprio punho de Dom Fernando, encontramos a descrição dessa Visita: — "Ao sairmos da mata, em São Felipe, "veio-nos ao encontro o Ilmo Sr. Satiro Ribeiro França, que "nos acompanhou até a sua residência que nos foi generosamente franqueada e onde grande número de nobres (...)"

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Futebol e História - III - Cachoeiro de Itapemirim

Após escrever o "Futebol e História - I" e o "Futebol e História II", vamos agora falar um pouquinho sobre aquela informação que passei à Lucimar Fernandes Machado em 2002. Embora tenha ele sido a única pessoa que me creditou como fonte, no site do Cachoeiro Futebol Clube, o dado que encaminhei foi muito sucinto, e basicamente é o que está no seguinte texto abaixo:

"A primeira partida realizada entre ambos os clubes [Cachoeiro e Estrela] ocorreu no mês de abril de 1916 e o resultado foi 0 a 0".

Naquela época, tantos dados de pesquisas históricas por mim feitas tinham sido utilizados sem citar a fonte, que eu pensava sempre duas vezes antes de compartilhar algo que eu tinha "garimpado". Enviei então apenas o mês e ano, e o resultado, da primeira partida de futebol disputada entre o Cachoeiro FC e o Estrela do Norte FC.

Hoje, folheando um dos meus "caderninhos", achei a data específica da partida:
Domingo, dia 02 de abril de 1916;
Empate de 0 x 0, o primeiro jogo entre os dois clubes.

Ao lado segue uma anotação minha:
"Uma semana depois: novo 0 x 0 - anotar elencos outro dia".


Como pesquisei todos os jornais do Estado disponíveis no Arquivo Público referentes ao ano de 1916, por causa da "guerra civil capixaba" do mesmo ano (chamada hoje de "Revolta do Xandoca"), é bem provável que eu tenha a anotação dos nomes dos jogadores que disputaram essa partida em algum lugar, embora só possa eu afirmar após "re-garimpar" meus bagunçados arquivos. De todo modo, caso eu não tenha anotado, com a data fica muito mais fácil encontrar os dados.

Também é importante registrar uns dados curiosos, referentes ao nascente futebol cachoeirense. Cachoeiro FC e Estrela do Norte FC foram fundados, ambos, em janeiro de 1916. Mas, em 1915 e em 1916, antes da fundação dos clubes supra aludidos, já tínhamos partidas de futebol envolvendo clubes na cidade. Abaixo ficam registradas duas delas, disputadas entre Cachoeiro Sport Club e Paineiras Football Club, embora eu não possua o resultado das mesmas:
19/12/1915 e 02/01/1916

Esse Cachoeiro SC já não existia mais no início dos anos vinte, e é bem provável que, com a fundação do Cachoeiro FC e do Estrela do Norte FC em 1916, não tenha ele passado desse último ano, embora ainda me faltem subsídios para assim afirmar. Quanto ao Paineiras FC, parece ter mantido atividade somente até 1919. Fato é que em abril de 1924, quando foi fundado o Norte Cachoeirense Football Club, haviam em atividade na cidade de Cachoeiro de Itapemirim somente mais outros três clubes: o Sport Club Brasileiro, o Cachoeiro Football Club e o Estrela do Norte Football Club.

Gerson Moraes França