segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O Porto de Limeira e o Pescador

Em uma de minhas andanças pelo Itabapoana, no ano de 2001, conversei com uma família de pescadores que habitam a margem espírito-santense do rio. O mais velho deles, patriarca da família (infelizmente, não me recordo mais seu nome, e não sei se ainda estaria vivo hoje), era já um homem idoso, que presenciou o "fim" de Limeira do Itabapoana.

Ele não viveu os tempos áureos do Povoado, mas chegou à conhecê-lo quando ainda habitado. Segundo ele, na década de vinte, quando era uma criança, lá existia ainda uma farmácia e pequeno comércio, além de uma escola; mas muitas residências já estavam desabitadas, e pequena parte já estava "caindo". Algumas edificações foram "desmontadas" por pessoas interessadas nas madeiras das mesmas.

Interessantemente, da varanda de sua pequena casa, é possível ver do outro lado do rio, encrustrada na colina, as ruínas da Capela que ainda insiste em permanecer de pé.

Segundo esse mesmo pescador, até a década de cinquenta ainda existia um pequeno estabelecimento comercial, e ele atravessava o rio em seu barco para se abastecer de mercadorias como sal e querosene. Testemunha viva que foi do "fim" de Limeira do Itabapoana, ele não sabia precisar exatamente quando o Povoado quedou totalmente desabitado. Segundo ele, as pessoas foram se mudando da localidade vagarosamente, até que não restou mais ninguém.

[Abrindo observação: na conversa que tive com a família, sentado na mureta da varanda e tomando um cafezinho, um dos filhos dele, também pescador, me mostrou um frasco de perfume francês datado do século XIX. Segundo ele, frascos, cerâmica e até moedas eram encontrados principalmente no inverno, quando o rio fica raso e surgem bancos de areia nas imediações. Eles escavavam esses areais atrás desses ítens, o que eles chamavam de "cavar o rio". Segundo os mesmos, os objetos encontrados eram vendidos à pessoas que vinham de Campos especialmente para adquirí-los dos pescadores. Tirando o frasco de perfume - "esse eu não vendo", dizia o mais velho - todos os objetos encontrados eram comercializados com os campistas.]

ABANDONO GRADATIVO

"É difícil encontrar testemunhas da história local, quando o povoado acabou os moradores tomaram rumos diferentes. A política de valorização do café implantada pelo governo Getúlio Vargas ajudou a celar o destino da localidade, que foi agonizando por décadas até não resistir." (1)

Embora um dos principais motivos da estagnação e posterior esvaziamento progressivo da Povoação de Limeira tenha sido a inauguração da Estação de Santo Eduardo, que passou à centralizar o escoamento do comércio de café do vale do Itabapoana, e considerando o testemunho do pescador com quem conversei, acredito que o informe acima citado esteja equivocado. É de se supor que, sim, a política de erradicação do café iniciada na década de sessenta (e não a política de valorização do café, iniciada no início do século XX e continuada quando da assunção de Vargas ao poder em 1930), tenha sido o golpe de morte na região.

Como é de conhecimento geral dos que pesquisam essa matéria, com a implementação da política de erradicação dos cafezais velhos, houve um esvaziamento da população rural em inúmeras localidades cuja principal atividade econômica era o café. Em Mimoso do Sul, por exemplo, todos os Distritos que não a sede perderam população, que migrou em grande parte para o Rio de Janeiro. Um Povoado antigo relativamente próspero chamado "Dona América", sede de Distrito e com uma pequena estação ferroviária, por exemplo, quase sucumbiu na época da erradicação dos cafezais, e por pouco não foi completamente abandonada, como o foi Limeira.

Concluindo. Embora não seja possível, pelo menos por enquanto, arbitrar uma data específica para o "fim" de Limeira do Itabapoana, o certo é que ao iniciar a segunda metade do século XX o Povoado já praticamente não mais existia como núcleo urbano. Abandoada paulatinamente pelos seus moradores, até que deles não restou mais ninguém, suas últimas edificações ruíram ou foram desmontadas, e o que restou de suas fundações foram sendo engolidas pelo mato e por sedimentos. Um pescador testemunhou isso, com seus próprios olhos.


Gerson Moraes França


Citação -
(1) Título: "A Extinta Vila de Limeira", in:
http://santoeduardo.no.comunidades.net/index.php?pagina=1382236851
Em 23 de novembro de 2009

4 comentários:

  1. Gostaria muito de saber onde estão os registros de nascimentos,batismos,casamentos e óbitos das pessoas que moravam em limeira. Isso é de suma importância para a história de minha família. O que você pode fazer pra me ajudar?

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  2. Olá Ana Maria!

    Bem, até 1890 os registros eram feitos nas Igrejas, sedes de Paróquia; acredito que esses papéis, caso existam, devam estar arquivados na Diocese que abrange a referida região (não sei se em Campos, Niterói ou Rio de Janeiro).

    Os registros depois de 1890 já eram feitos em Cartório; assim, resta saber aonde eram registrados os nascimentos, casamentos e óbitos dos que residiam em Limeira. Provavelmente, esses livros devem estar em Santo Eduardo. Mas é preciso ir mais fundo, para saber se lá havia cartório, e ainda há. etc.

    Grande abraço,
    Gerson

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  3. Olá Gerson. Primeiramente gostaria de expor a agradável surpresa de conhecer um pouco do seu trabalho a partir deste blog. Muito bom! Estou realizando uma pesquisa dos familiares da minha esposa (Família Mozelle - do original Mosele) e li que um antepassado dela desembarcou do navio "matteo Bruzzo" em agosto de 1895 e o destino foi o rio itabapoana. Este rio tinha capacidade portuária para desembarcar navios de passageiros? Gostaria que você expusesse um pouco sobre isso. Entendi por que está região foi atrativa para a imigração e o período de prosperidade. Abraços. Duérgnes Correa Assunção

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  4. Olá Duérgnes! Obrigado pelo elogio. É fator motivante para mim! =)

    A barra do Itabapoana não era fácil, exigindo práticos que rebocavam sumacas ou barcos maiores, como vapores, para dentro do porto. Mas comportava, sim, navios de médio porte. Grandes embarcações, do final do século XIX, não eram comuns nesse porto, que abrigava mais a navegação de cabotagem.

    Abração,
    Gerson

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