sábado, 13 de março de 2010

Um pouco sobre os antigos índios do Itabapoana



Possuo farto material documental sobre os indígenas que um dia habitaram o território do atual município de Mimoso do Sul. Apenas por si, esse tema possui elementos o suficiente que serviriam para escrever um extenso livro.

O objetivo aqui, porém, é tentar deixar o assunto bem sucinto, sem descer em detalhes e minúcias. Intencionamos dar ao leitor apenas uma pequena, mas importante, noção de quem eram os "nossos" índígenas quando aqui aportaram os europeus.

Antes, é importante lembrar que, no curso da história, os documentos grafam a nomenclatura das nações e tribos de várias formas diferentes, embora sejam todos muito parecidos entre si. Assim, decidimos por adotar nesse texto os nomes "aportuguesados modernamente", para facilitar e metodizar o artigo.


OS GOITACASES

Quando os europeus se estabeleceram no baixo Itabapoana, pouco antes de 1540, encontraram uma nação indígena chamada, pelos tupis, de goitacás. Os cronistas divergem sobre o significado da alcunha, embora haja uma certa unanimidade em traduzir o nome goitacás como corredor, ou nadador. Atualmente, é de conhecimento geral que os goitacases são do tronco chamado de macro-gê, e não falavam o tupi. Eram, grosso modo, tapuias (bárbaro ou inimigo em tupi).

Os primeiros contatos foram, de certo modo, pacíficos. Os goitacases da região aceitaram o estabelecimento dos portugueses, animados e interessados no comércio de bens manufaturados como machados, facas, anzóis, pentes e espelhos, que eram novidade e tinham muita utilidade para eles. Chegaram mesmo a trabalhar na formação dos canaviais, em troca desses bens.

Mas os goitacases eram arredios. Um incidente envolvendo um chefe indígena acabou por levantar a tribo, que destruiu e queimou os canaviais. Feita a paz, logo outro incidente aconteceu, e desta vez a guerra foi ainda mais renhida; destruíram e queimaram novamente os canaviais e os recém montados engenhos, e por fim expulsaram os europeus do baixo Itabapoana. Depois disso, os goitacases passaram a evitar qualquer contato com os europeus, assaltando-os e combatendo-os sempre que necessário, e não aceitando fazer paz.

Antes da chegada dos europeus, os goitacases estavam em expansão. Haviam descido o Paraíba do Sul, assenhorando-se dos campos que hoje pertencem ao município de Campos dos Goitacazes e arredores. Haviam chegado ao litoral a não muito tempo. Tal fato é atestado pelos sítios arqueológicos tupi encontrados no baixo Itabapoana, cuja datação não é muito anterior ao início do século XVI. Esses sítios, inclusive, foram identificados apenas como acampamentos provisórios, sem evidências que atestem uma permanência estável. As crônicas da época atestam que os goitacases guerreavam com grupos tupis do sul do Espírito Santo, e que expulsaram os tupis papanases do litoral.

Cronistas antigos chegam à afirmar que uma partida de goitacases, dos que expulsaram os europeus do Itabapoana, foi ter ao Espírito Santo em 1546/1547. A maioria reza que eles chegaram até o rio Benevente, que banha a atual cidade de Anchieta. Alguns mencionam que eles foram ainda mais além, atingindo Guarapari; há ainda menção de que os goitacases chegaram às proximidades de Vila Velha, chegando a atacar os estabelecimentos portugueses lá existentes. Seja o que tenha acontecido, verossímel parece que organizaram e executaram uma expedição que subiu o litoral, e é provável que tenham atingido a região de Anchieta, voltando para o sul logo depois.


COMO ERAM?

Eram muito bons nadadores, e sentiam-se à vontade no ambiente de brejos e lagos da região. Não formavam aldeias, e não praticavam a agricultura como os tupis. Nômades, suas hordas vagavam pela região praticamente sem se fixar em algum sítio, os tornando muito móveis e "corredores", como se falava da linguagem da época. Viviam da caça/pesca e da coleta. Suas tribos lutavam umas com as outras, mas por vezes se confederavam quando havia algum inimigo em comum. Homens e mulheres combatiam, diferentemente dos tupis, onde só os homens iam para a guerra.

Suas hordas não eram muito numerosas. As cabildas possuiam cerca de 200 pessoas, entre homens, mulheres, velhos e crianças. Estavam divididos, no final no século XVI, em 4 grupos maiores, cada grupo contendo entre 3 e 5 hordas aparentadas.


O QUE ACONTECEU COM ELES?

Após guerrearem e expulsarem os europeus do baixo Itabapoana, passaram a ser muito temidos entre os portugueses. Todos que passavam pelo litoral do atual norte fluminense o faziam com cautela, e só desembarcavam em terra em último caso. Entre 1546, quando expulsaram os portugueses do Itabapoana, e 1594, quando foi organizada uma expedição punitiva contra eles, essa parte do Brasil permaneceu inacessível ao europeu. Após a referida expedição, os goitacases recuaram do litoral e se internaram nos campos do baixo Paraíba do Sul, mas continuaram ameaçando a zona litorânea com suas correrias e obstaculando qualquer estabelecimento português.

Alguns anos depois, no início do século XVII, grassou entre os goitacases severa epidemia, que muito os debilitou. Uma frouxa aliança entre ingleses e holandeses, que tentaram se estabelecer perto da sua zona, pode ter sido a origem da epidemia, embora seja crível que a doença tenha ceifado vidas de tempos em tempos. As autoridades portuguesas, alarmadas com a presença dos estrangeiros, logo organizaram uma expedição para expulsá-los antes que se consolidassem no terreno. Ato contínuo, após desarticular a tentativa inglesa/holandesa, levaram a guerra aos debilitados goitacases. Junto com aliados tupis, os portugueses massacraram várias cabildas. A guerra foi tão cruel, que os goitacases abandonaram os campos do baixo Paraíba do Sul e as lagunas, internando-se no noroeste fluminense.

Em 1617, finalizada a guerra, tupis do Rio de Janeiro e, mais tarde, do Espírito Santo, foram deslocados para formarem Aldeamentos no litoral, sob a coordenação dos padres Jesuítas. Para se ter noção da gravidade da epidemia e da guerra que assolou os goitacases, os remanescentes de uma tribo inteira deles foi ter à um dos Aldeamentos, pedindo para serem aldeados. Os campos dos goitacases esvaziaram-se de tal forma que, quando a região foi doada em sesmarias à alguns portugueses e brasileiros ainda no século XVII, já não haviam mais índios selvagens por lá. Apenas o nome "Campos dos Goitacazes" ainda fazia lembrar de que ali haviam vivido esses bravos indígenas.

Os remanescentes das debilitadas hordas que não se renderam afastaram-se para o interior, e os estudiosos afirmam que eles acabaram mesclando-se com grupos também do tronco macro-gê que habitavam as cabeceiras dos rios Muriaé e outros rios da região. Alguns pesquisadores entendem que os coropós e os puris do século XVIII e XIX seriam resultado dessa mescla.


E EM MIMOSO?
Goitacases expulsos, chegam os Tupis.

Como vimos, a região do Itabapoana era habitada e percorrida, no século XVI, pelos índios goitacases. No início do contato com os europeus, chegaram a trabalhar pacificamente na formação dos canaviais da região da atual cachoeira das Garças, em troca de bens manufaturados e mantimentos. Desentendidos com os forasteiros, fizeram contra eles duas guerras, e por fim os expulsaram do Itabapoana em 1546.

Organizaram uma partida que correu pelo litoral, atingindo no mínino a região de Anchieta. Depois dessa correria, retornaram aos seus sítios no atual norte fluminense. Até 1594 impediram qualquer estabelecimento na região, e nesse ano foram batidos por uma expedição que os repeliu do litoral. Foi somente nessa data que o Itabapoana tornou-se relativamente "seguro" para se povoar novamente. Próximo ao ano de 1620, os Jesuítas construíram uma Capela (Nossa Senhora das Neves) e formaram uma Fazenda (Muribeca), deslocando para a região do Itabapoana índios tupis que estavam reduzidos em Anchieta, então chamada de Rerigtiba.

Um pequeno grupo desses índios se estabeleceu na região da cachoeira das Garças, onde viviam em cultura de subsistência, com pequena lavoura de mantimentos e vivendo da atividade pesqueira. O nome dessa pequena aldeia era São Pedro Apóstolo, que passou à ser chamada coloquialmente de São Pedro do Norte, por causa da aldeia de São Pedro do Cabo Frio (atual São Pedro da Aldeia).

Sem o perigo dos goitacases, expulsos da região, esses índios tupis semi-aculturados viveram tranquilos na aldeia de São Pedro por cerca de dois séculos, até que começaram à ser acossados pelos puris no final do século XVIII. A aldeia era pequenina, e não tinha mais que 50 moradores.

Várias vilas, e até cidades atuais, tiveram origem parecida à da aldeia de São Pedro - índios tupis aculturados ou semi-aculturados que foram formar pequenas roças de subsistência nas proximidades de algum Aldeamento, Fazenda ou Igreja/Capela Jesuíta, e passaram a se dedicar à pesca. Essa é a origem remota das atuais Piúma, Itaoca/Itaipava, Meaípe, Perocão, Santa Cruz, Riacho, dentre outras. Representam a chamada cultura maratimba, os nossos caboclos, tão celebrada por Rubem Braga em seus escritos.

6 comentários:

  1. Parabéns pelo blog. Historia e cultura de nossas raizes. Abraço! Airton

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  2. Valeu!! amigo por essas informações.
    resolvi pesquisar sobre minhas origens em mimoso do sul. me chamo Margaret Souza e atualmente moro em Fortaleza. Obrigado.

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  3. valew mais eu queria saber mesmo sobre a situação atual deles e agricultura valew assim mesmo tô feliz com oque peguei ! mais bota mias informação xau !

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  4. Olá! Tem como me dar cópias desses documentos? Eu quero muito pesquisar minhas origens.

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  5. Exiatia essa tribo no estado de minas gerais? Próximo Cataguases ,mg

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