domingo, 30 de outubro de 2011

Cadastrar a Pobreza é Avanço?


Há pouco tempo a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de Mimoso do Sul foi furtada. Dentre os objetos surrupiados estava o CPU que funcionava como servidor do Programa Bolsa Família no Município, onde estavam armazenados os dados das famílias inventariadas no Cadastro Único, bem como, é claro, os dados das famílias beneficiadas pelo PBF em Mimoso do Sul. O site MimosoOnLine noticiou esse lamentável fato em matéria publicada no seu portal, que foi comentada por vários leitores. Foi ali que tomei conhecimento do fato de que existiam cadastradas no CadÚnico, em agosto de 2011, o montante de 4.169 famílias pobres em Mimoso do Sul. Um incremento de 313 famílias em relação ao mês anterior, quando havia 3.856 famílias inventariadas no CadÚnico em Mimoso. "Um grande avanço da Administração", como afirmou o Gestor do PBF no Município.

Não consegui deixar de refletir sobre essas palavras. Afinal, cadastrar a pobreza poderia ser chamado de avanço? Sim, ou não?

O Cadastro Único para Programas Sociais é um instrumento que identifica as famílias de baixa renda, caracterizadas como famílias pobres, objetivando enquadrá-las no perfil do Bolsa Família quando se encaixarem nos requisitos para o recebimento do benefício. Cabe ao Município implementar e executar esse inventário. Segundo o PNAD de 2006, a estimativa das famílias pobres em Mimoso do Sul, com requisitos para adentrarem como cadastradas no CadÚnico, era de 4.738 famílias. Assim, observamos que o Município está ouvidando esforços para identificar e cadastrar essas famílias; essa não é uma tarefa fácil, e certamente merece elogios.

Mas, ainda assim, permanece a pergunta: cadastrar a pobreza é um avanço?

Primeiro, vejamos o que significa a palavra "avanço", no sentido que foi empregada na expressão do Gestor do PBF em Mimoso do Sul. Consultando um dicionário, e de acordo com o sentido dado, "avanço" seria "caminhar para adiante", "progredir". E "progredir", seguindo a mesma linha, seria "desenvolver-se", "adiantar-se".

É obrigação social do Município cadastrar as famílias pobres no CadÚnico. Identificar essas famílias não é trabalho fácil, ainda mais quando muitas delas ainda são desinformadas e não conhecem os direitos que possuem. Mas, reiteremos: é uma obrigação social do Município, que a executa através de seus agentes públicos. Não fazer isso, ou fazer isso mal feito, seria, pura e simplesmente, omissão, ou negligência. Assim, cadastrar a pobreza é uma obrigação da Administração; não seria um avanço. As "tarefas" ordinárias de competência da esfera municipal têm que ser executadas e, se não o forem, teríamos, sim, um "desavanço". Coletar lixo, tratar da rede de água já estabelecida, cuidar das vias públicas e cadastrar a pobreza são obrigações do Município. A Administração TÊM que fazer isso.

Importante que se reconheça novamente, porém, que ao que parece temos pessoas competentes gerindo o CadÚnico em Mimoso do Sul. A tarefa está sendo feita, e isso tem que ser dito. Em Municípos onde carecem quadros técnicos, competentes ou compromissados em abundância, a execução bem feita de uma obrigação é motivo para elogios. Mas daí para reconhecermos isso como um "avanço" são "outros quinhentos", como reza o jargão popular.

Avanço acontecerá quando o número de cadastrados no CadÚnico, bem como o número de beneficiários do Programa Bolsa Família, começar à decrescer. Pois isso significará que teremos famílias saindo da "linha de pobreza", e isso sim seria progredir e desenvolver.

E o que as sucessivas Administrações Municipais podem fazer para que isso ocorra? Como reduzir a pobreza e a desigualdade em Mimoso do Sul? O Município é capaz de atuar nesse sentido? Ou isso está fora do alcance da municipalidade? Perguntas que não são fáceis de responder, até porque as respostas podem ser muitas e em várias vertentes. Mas alguma coisa precisa ser feita pois, ao contrário do que vem ocorrendo no país, nesses últimos anos Mimoso do Sul parece estar estagnada no tempo. E, mesmo, regrediu em alguns indicadores; a pobreza e a desigualdade vem caindo, sistematicamente e respectivamente, desde 1994 e 2003, no Brasil. Por que isso não está acontecendo em Mimoso?

Leia mais sobre os indicadores no próximo post, se quiser.

Gerson Moraes França

domingo, 2 de outubro de 2011

Pedro Ferreira da Silva

Tempos que não escrevo para o Blog. Início de nova Faculdade que, interessantemente, tem me exigido muito mais do que o primeiro curso universitário que eu fiz. Agora estou aprendendo a História e suas nuances mais basilares e elementares; sua cientificidade, métodos, correntes, "espíritos" e pensamentos filosóficos, dentre muitas outras coisas mais. E estou gostando, muito.

Agora está crescendo em mim uma forma, talvez, mais crítica e metódica de analisar, e não apenas escrever, a História. Não que antes não fosse assim; mas agora isso se torna cristalino e inteligível dentro de mim.

No mundo de hoje, na medida que a Internet vai nos facilitando ter acesso às mais diversas fontes, primárias ou fruto de pesquisa de algum historiador ou memorialista, a análise e estudo da História vai tomando, em minha opinião, uma nova dinâmica. Antes, ter acesso à certas fontes era dificultoso: como, por exemplo, ir pesquisar a família Ferreira da Silva lá em Oliveira, Minas Gerais? É certo que os descendentes do fundador da Fazenda Mimoso possuem muitos documentos que subsidiam o engendramento de nossa História local, mas muita coisa estava simplesmente fora de nosso alcance, ao menos em curto prazo.

Na medida que vamos tomando contato direto com fontes primárias, vamos observando que certas construções ou tradições históricas não são assim tão verdadeiras. Isso eu já tinha observado quando de minha pesquisa sobre a Revolução de 1930 e a mudança da sede da Comarca no mesmo ano. Tendo acesso às fontes primárias, notei que o que se dizia sobre essa "parte" de nossa História local não correspondia à realidade dos acontecimentos. E a uns poucos meses, notei uma nova discrepância, construída possivelmente sem má-fé e por simples analogia.

Sempre se afirmou que a colonização da alta e média bacia do Itabapoana recebeu grande incremento de fazendeiros mineiros que vieram para o Espírito Santo após a Revolta Liberal de 1842, em Minas Gerais. E isso é, realmente, verdade, e foi demonstrado no trabalho de Milton Teixeira Garcia (O Vale do Itabapoana e a história de São Pedro do Itabapoana e São José do Calçado). Muitos dos futuros grandes fazendeiros do Itabapoana espírito-santense eram mineiros do Partido Liberal, e alguns tomaram parte ativa naquele movimento armado; uns vieram para as matas do sul do nosso Estado para buscar novo refúgio e/ou construir nova vida, pois a anistia de 1844 não impedia as perseguições subsequentes. Assim, por simples analogia de historiadores e memorialistas locais, construiu-se a versão de que o Capitão Pedro Ferreira da Silva havia vindo para o Muqui do Sul por ter tomado parte no movimento de 1842, e por estar sofrendo perseguições em Minas Gerais. Escrevi até um pouco sobre isso, em escrito intitulado "O Início da História de Mimoso do Sul", caindo no mesmo erro.

E aí entra o "maravilhoso mundo da Internet" e suas novas possibilidades de compartilhamento de informações, pesquisas e fontes. Pois foi pela web que consegui ter acesso a uma rica pesquisa, ainda em construção, de compilamento e de concentração de fontes primárias, levada a efeito por pesquisadores mineiros. São inventários, certidões, pesquisas cartoriais, dentre outras, que estão sendo inventariadas e compartilhadas na rede mundial. O nome do site já diz tudo: http://www.projetocompartilhar.org/. E foi também graças ao "mundo internético" que pude acessar uma fonte importante, que desqualificou a hipótese de que Pedro Ferreira da Silva tenha sido um dos mineiros "liberais de 1842". É o acervo dos processos criminais do Forum de Oliveira/MG, que se encontra disponível para consulta em http://www.acervos.ufsj.edu.br/.

Compulsando essas fontes "digitais", todas elas primárias, pude perceber que o Capitão Pedro Ferreira realmente tomou parte na Revolta Liberal de 1842; só que não como "revoltoso", mas sim como "legalista". Ele e seu irmão Bartholomeu, que era então o "chefe político" da família, ajudaram à reprimir e, também, a perseguir os "revoltosos" em Oliveira. E, com isso, criaram uma série de inimizades que, talvez, tenham tido influência na decisão dos dois irmãos de deixarem Oliveira e procurarem novos rumos. É fato também que os dois irmãos brigaram, diz-se que por questões patrimoniais; cada qual tomou caminho diferente, e de acordo com testemunhos de descendentes de Bartholomeu, só muitos anos depois dessa briga é que os irmãos refizeram as pazes e se reencontraram. Fato interessante: os irmãos Ferreira da Silva eram casados com duas mulheres que eram irmãs.

Mais tarde conto mais.

Gerson Moraes França