Trincheira legalista em Silveiras/SP |
Quando estourou a revolução, o negócio ameaçou ficar feio. São Paulo aderiu em peso, inclusive com a maioria das guarnições federais. No sul do Mato Grosso, criaram até um novo Estado, que subsistiu por pouco tempo: Maracajú, mais ou menos o que se tornaria o Mato Grosso do Sul. Nomes importantes estavam implicados no movimento, nomes inclusive que ajudaram a fazer a Revolução de 1930. Houve luta armada no Rio Grande do Sul, onde Borges de Medeiros resistiu por um bom tempo. Também em Minas Gerais, liderada por Arthur Bernardes. Mas a adesão do Rio Grande do Sul não veio, porque Flores da Cunha acabou decidindo-se por apoiar o Governo Central. Nesse Estado e em Minas Gerais, logo os grupos revoltosos foram isolados. E Vargas pôde mandar tudo o que tinha contra São Paulo. No meio desse "tudo o que tinha", estavam os recursos humanos e materiais do Espírito Santo. São Paulo, isolado, conseguiu resistir por três meses, em uma guerra que ceifou centenas de vidas e destruiu mais um tanto enorme de propriedades.
No Espírito Santo, logo o Interventor Bley prestou solidariedade ao Governo Vargas, e se dispôs a auxiliar na luta contra os revoltosos. Foram presos alguns líderes ligados à Bernardes, e pessoas suspeitas de ligação com o movimento. Simpatizantes também foram detidos. Por exemplo, em Muqui foram presos Geraldo Vianna e Belizário Lima, proprietário e redator-chefe do jornal Muquyense, de grande circulação no sul do Estado. O jornal ficou fechado de 18 de agosto a 16 de outubro. Vianna, revolucionário de 1930 que fazia oposição ao Governo Bley, foi preso no dia 08 de agosto e só foi solto no dia 01º de setembro. Belizário ficou preso por 31 dias. Em outro exemplo, o Delegado de Polícia de João Pessoa (atual Mimoso do Sul), Florício Paulo dos Santos, teve que correr até o distrito de Conceição do Muqui, região muito ligada à Muqui e onde estava sendo organizada uma pequena "tropa" de simpatizantes; "tomou logo providência e vigia alguns implicados no trama", pois Conceição tinha "os seus revoltosos", como anunciava o Delegado.
E logo o nosso Estado tratou de enviar tropas para o front em São Paulo. Num primeiro momento, inúmeros voluntários se apresentaram, ou foram despachados para a capital pelas autoridades do interior. Os voluntários foram tantos, que no dia 14 de julho o Interventor Bley teve que começar a telegrafar aos Municípios pedindo para que não enviassem mais homens para Vitória. Muitos foram aproveitados, mas quase todos foram dispensados ou colocados em "reserva". O RPM criou mais dois Batalhões (um em 15 de julho e outro em setembro). Assim, o Regimento Policial Militar (atual Polícia Militar) e o 3º Batalhão de Caçadores (atual 38º Batalhão de Infantaria, guarnição do Exército) foram mobilizados para a luta, e enviaram seus efetivos para a guerra.
Afora isso, foram criados "batalhões patrióticos" em vários municípios, assim como muitos criaram suas Guardas Municipais para policiar e suprir o chamamento dos destacamentos policiais que foram recolhidos para a capital. Em São José do Calçado, por exemplo, o "batalhão patriótico calçadense" foi criado no dia 13 de julho reunindo um efetivo de 56 homens (26 deles, reservistas). Em Alegre, além da remessa de quase 50 voluntários para Vitória, foi criada uma Guarda Municipal com o efetivo de 20 homens. Pouco depois, os "batalhões patrióticos" foram dissolvidos, ou tiveram seu efetivo reduzido nas localidades que não criaram suas Guardas Municipais. Continuando com o exemplo de Calçado, seu "batalhão patriótico" foi dissolvido já no dia 14, e depois recriado com um efetivo de 10 homens para auxiliar o policiamento.
NOSSAS TROPAS NA GUERRA
O 3º Batalhão de Caçadores lutou no flanco esquerdo do setor do vale do Paraíba, e depois no setor do noroeste paulista. Esteve em Bananal, Sertãozinho, Barreiros, Silveiras, Queluz, Barra Mansa, Ouro Fino, Mogi-Mirim, Piteiras, Artur Nogueira e Limeira. O 1º e o 2º Batalhões do RPM lutaram no Setor da Serra do Mar e depois rumaram para o vale do Paraíba. Estiveram em Paraty, Cunha, Lagoinha, São Luiz de Paraitinga, Taubaté, Cataguá e Pindamonhangaba. O 3º Batalhão do RPM serviu de reserva no Vale do Paraíba, acantonado em Lorena. Nossas unidades militares estavam integradas em Comandos Superiores, que eram integrados por outras unidades, de vários lugares do país.
Focando nas operações de nosso Regimento Policial Militar, a missão foi árdua e importante, e de muito impacto no desenrolar da guerra. O setor de Cunha foi ferozmente defendido por São Paulo, pois seu rompimento ameaçava a linha principal do Vale do Paraíba, onde estavam concentrados os maiores esforços dos revolucionários e dos legalistas. O RPM atuou junto com os Fuzileiros Navais na operação principal do Destacamento Mixto, que era tomar Cunha, subindo a serra do mar a partir de Paraty. Atuaram principalmente no flanco esquerdo do avanço. A tropa chegou a entrar em Cunha e avançar para Lagoinha (em julho), mas depois uma contra-ofensiva paulista desalojou os legalistas de suas posições (em agosto). Após reorganizar a força (no início de setembro), nova e forte ofensiva legalista foi realizada, e a cidade de Cunha foi tomada novamente. Os Batalhões do RPM, após tomarem parte na conquista e ocupação de Cunha, ficaram com a missão de seguir para o oeste, para a tomada de Lagoinha e São Luiz de Paraitinga, enquanto os FN forçavam a ofensiva em direção ao vale do Paraíba.
Nossos soldados capixabas cumpriram a missão. Entraram em Lagoinha sem grande resistência, mas tiveram que lutar por 3 dias para tomar São Luiz de Paraitinga. Pouco depois a guerra terminou, com a rendição de São Paulo. Essas cidades, quando tomadas, estavam desertas, pois a população civil havia abandonado suas casas ante o avanço da força legalista. Interessantemente, por alguns dias estas duas cidades foram administradas por capixabas, umas vez que os Comandos nomearam os Prefeitos Militares das mesmas após suas respectivas ocupações. Em Lagoinha, no dia 25 de setembro, foi feita a nomeação e posse do Prefeito Militar interino, o 2º Tenente Rosental Machado Alves - apenas dois comerciantes paulistas, que não fugiram, estiveram presentes na posse. Em 01º de outubro foi feita a nomeação e posse do Prefeito Militar interino de São Luiz de Paraitinga, o 2º Tenente Plácido Azevedo, na presença de apenas um morador.
Pouco depois de terminada a guerra, nossos soldados voltaram para casa. Os três Batalhões do RPM chegaram em Vitória no dia 18 de outubro de 1932. Foram três meses em operação na guerra. O Regimento Policial Militar nesses dias de guerra esteve com um contingente de 1.328 homens, entre regulares e voluntários. Desses, 926 foram mandados para lutar em São Paulo. 727 homens estiveram em operação diretamente na linha de frente. Nossa tropa espírito-santense sofreu com 58 mortos, 78 feridos e 156 extraviados ou desaparecidos, num total de 292 baixas.
[mais tarde, colocarei aqui um mapinha que estou fazendo]
Gerson Moraes França
Fontes:
História da Polícia Militar do Espírito Santo
1985 - Sônia Maria Demoner
Diário Oficial da União
(julho a outubro de 1932)
Jornal Diário da Manhã
(julho a dezembro de 1932)
Interventoria (Governadoria)
APE - telegramas expedidos e recebidos (1932)
Prezado Gerson,
ResponderExcluirJá querendo abusar do seu conhecimento histórico, sobre a revolução constitucionalista, o que motivou a participação do Espirito Santo do lado federalista? O interventor Bley tinha quais interesses no governo Vargas? Alguma coisa contra o regime "café com leite"?
Cordialmente,
Wagner
Parabéns.. excelente matéria! Precisamos de mais pesquisas históricas, já que nosso passado é tão omitido.
ResponderExcluirOlá, meu avó era da policia militar e lutou nessas batalhas. Em sua pesquisa, você encontrou nomes?
ResponderExcluirBoa tarde Gerson, meu nome é Genivaldo, gostaria de saber se é possível ter acesso a relação dos nomes dos combatentes que foram para o front em São Paulo? Pois meu pai diz que meu avô lutou nesta revolução junto com o exército do Espirito Santo.
ResponderExcluir